MD Francês: 80% de chances do contrato indiano do Rafale ser assinado
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O Poder Aéreo traz informações compiladas dos jornais franceses Le Monde e Le Figaro sobre a escolha do Rafale pela Índia – e alguns trechos de uma crônica bem-humorada
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Matéria publicada no jornal francês Le Figaro na quarta-feira, 1º de janeiro, traz declarações do ministro da Defesa da França, Gérard Longuet, sobre os próximos passos para a concretização da venda do Rafale à Índia, após este ter sido selecionado como vencedor do programa indiano MMRCA (aeronave de combate multitarefa de porte médio).O programa prevê a aquisição de 126 aeronaves.
Questionado sobre a probabilidade do contrato ser realmente assinado, o ministro respondeu: “Na minha opinião, é de 80%.” Ele ainda afirmou que “os mais otimistas” acreditam que o tempo até a assinatura será de “seis a nove meses.” Falando em otimismo, disse também que “a Dassault está na Índia há quase 60 anos. É uma parceria de muito longo prazo, a empresa conhece o seu cliente, a Força Aérea Indiana. Portanto, esta é uma lição de otimismo, sob a condição de que vá até o fim.”
Sobre o contrato, Longuet ainda disse que “os fatores em discussão são, naturalmente, as configurações do equipamento militar, os eletrônicos, a integração do aparelho no sistema indiano, o aumento da produção” e “quem é responsável pela fabricação na Índia”.
Sobre o assunto da fabricação, outro jornal francês, o Le Monde, informa que esse deverá ser o grande desafio para a Índia: a produção local do Rafale.
A Índia dispõe de uma frota que está envelhecendo e precisa, rapidamente, de novas aeronaves para manter sua defesa aérea. Para complicar ainda mais, o país tem relações tensas com seus vizinhos, a China e o Paquistão, e ambos vêm se rearmando e desenvolvendo, em conjunto, aviões de caça.
Segundo o especialista indiano em defesa, Shiv Aroor, “no longo prazo, a Índia tem necessidade de 300 aviões de combate e não é impossível que as encomendas de Rafale sejam ampliadas.” No curto prazo, o importante é finalizar a encomenda de 126 aeronaves. As negociações exclusivas serão iniciadas entre a França, a Índia e a Dassault, para determinar a cadência de entregas do Rafale e finalizar os aspectos técnicos e financeiros do contrato.
As negociações prometem ser longas e delicadas, no contexto econômico difícil que atravessa a Índia com a desvalorização da rúpia frente ao dólar, em 2011. O fator determinante do custo é o da “manutenção em condição operacional” por quarenta anos, e não o custo unitário das aeronaves. Mas a indústria aeronáutica francesa tem a vantagem de que seus aviões são exportados para a Índia desde 1953, sendo muito apreciados pelos militares indianos. O desempenho dos Mirage 2000 franceses na guerra do Kargil contra o Paquistão, em 1999, teve um papel que não pode ser negligenciado em sua vitória.
A Dassault se prepara para fazer grandes sacrifícios no que se refere a transferência de tecnologias e compensações industriais. O contrato, se assinado, deverá beneficiar empresas indianas, especialmente a estatal Hindustan Aeronautics Limited (HAL) que deverá montar o Rafale. Até a construção da linha de montagem em Bangalore, os primeiros 18 caças Rafale serão montados na França, e entregues em até 36 meses após a data de assinatura do contrato.
A pergunta é se a indústria de defesa do país, em parte privatizada há onze anos mas composta essencialmente de empresas estatais, será capaz de absorver as tecnologias e cooperar com a Dassault em uma aeronave tão avançada. Para Shiv Aroor, “esse é o grande desafio. As compensações industriais não ser farão automaticamente para o setor de defesa, de forma estrita. Poderão envolver também a aviação civil ou a produção de software.”
Mas, além das discussões sérias sobre o contrato, o Le Monde também traz um pouco de humor. É o caso de uma crônica assinada por Stéphane Lauer, da qual trazemos abaixo (numa tradução livre) alguns trechos, dando pistas sobre o estado de espírito dos franceses após receberem a boa notícia:
“O Rafale foi ridicularizado, o Rafale foi vaiado mas, finalmente, o Rafale foi comercializado.”
“Imaginem: onze anos de fracassos repetidos pelos quatro cantos do planisfério, dos Países-Baixos à Coreia do Sul, passando por Singapura e Marrocos. Ninguém queria nosso canivete suíço aeronáutico, o avião multifuncional, capaz de cumprir todas as missões num só golpe de asa. Mesmo os suíços, justamente eles, de nariz empinado, preferiram comprar suecos. Acabamos acreditando que a aeronáutica era um esporte desses muito caros, em que os franceses ainda perdem no final.”
“E agora, quando menos se esperava, quando já se acreditava que o único cliente que o Rafale teria era o contribuinte, eis que chega o grande prêmio, o contrato do século, aquela oportunidade que não pode ser desperdiçada pois, segundo os especialistas, não vai se repetir jamais.”
“Espremidos entre os traumas dos fracassos do passado e o desejo de levar a batalha aos céticos, nós procuramos a todo custo evitar o entusiasmo. Porque, como observou um especialista em aeronáutica, James Hardy, ‘qualquer estudioso indiano em compras públicas sabe que nada é certo até que o contrato seja realmente assinado.’ Tudo bem, foi um anglo-saxão que falou isso, mas, nesse tipo de assunto, a prudência é a mãe da segurança.”
“No entanto, não vamos estragar a boa notícia, que vai muito além dos 1,15 bilhão de euros ganhos na bolsa pela Dassault ao final da terça-feira, 31 de janeiro. É um balão de oxigênio para nossas finanças públicas. Num momento de escassez orçamentária e de comércio exterior vacilante, o contrato caiu muito bem. Uma justa recompensa após anos de apoio ininterrupto por parte do Estado a um contrato que custou ao contribuinte mais de 40 bilhões de euros.”
FONTES: Le Figaro e Le Monde (tradução, adaptação e edição: Poder Aéreo)
FOTOS: Força Aérea Francesa (Armée de l’air) e Dassault