Leia a íntegra do relatório sobre o acidente do voo da Air France

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Órgão francês apontou série de falhas de pilotos na queda do voo Rio-Paris em 2009

O BEA (Escritório de Investigações e Análise), órgão oficial francês encarregado de investigar o acidente do voo Rio-Paris em 2009, considerou em seu relatório divulgado nesta sexta-feira (29) que uma série de erros dos pilotos provocou a queda da aeronave.

Leia a seguir a íntegra do documento, publicado hoje. A tradução para o português foi feito pelo órgão da França.

“Investigação de segurança sobre o acidente ocorrido em 01 de junho de 2009 com o Airbus A330-203, voo AF447”

Le Bourget, 29 de julho de 2011

No domingo, 31 de maio de 2009, o Airbus A330-203 matrícula F-GZCP operado pela empresa Air France decolou às 22h29 para efetuar o voo regular AF447 entre Rio de Janeiro (Galeão) e Paris (Charles de Gaulle). Doze membros da tripulação (3 PNT, 9 PNC) e 216 passageiros estavam a bordo.

Introdução

O relatório da etapa No. 3 pode ser emitido graças a leitura completa dos registradores de bordo, recuperados no inicio de maio de 2011, apos varias incursões de pesquisadores submarinos.

Até então, as informações disponíveis não permitiam uma compreensão das circunstâncias do acidente. Ainda assim, com base nessas informações, varias recomendações de segurança já haviam sido emitidas pelo BEA: elas aparecem no relatório da etapa No. 2.

Nas ultimas semanas, a analise dos dados do registrador de dados e do registrador de voz  deram uma contribuição decisiva para a investigação. Eles permitiram conhecer as circunstâncias exatas do acidente, ter elementos de análise sobre a evolução do voo, estabelecer novos fatos e emitir recomendações de segurança, que figuram neste relatório.

A investigação prosseguiu em direção a uma análise mais aprofundada para determinar as causas do acidente, que serão incluídas no relatório final do BEA.

Desenrolar do voo e novos fatos estabelecidos

– Fase 1: do inicio da gravação do CVR até a desconexão do piloto automático;

– Fase 2: da desconexão do Piloto Automático até o disparo do alarme de estol;

– Fase 3: do disparo do alarme de estol até o fim do voo.

Fase 1 : do início da gravação do CVR até a desconexão do piloto automático

No inicio do CVR, pouco depois da meia-noite, o avião está em cruzeiro ao nível do voo 350. O piloto automático 2 e a autopropulsão estão engajados. O voo é tranquilo, a tripulação está em contato VHF com o centro de controle de Recife.

A tripulação discute a alta temperatura (padrão mais onze) e constata que as condições meteorológicas não representam problema.

O Comandante de bordo propõe ao copiloto que descanse um pouco por causa do comprimento de seu turno. Este ultimo respondeu que não queria dormir.

As 01 h 35 min e 15 s, a tripulação informou o controlador ATLÂNTICO que passou o ponto INTOL e anuncia as seguintes estimativas:

SALPU as 01h48 e ORARO as 02h00. Ela também transmite o seu código SELCAL e um teste e realizado com sucesso.

As 01 h 35 min 46 s, o controlador pediu que ele mantenha FL350 e informe sua estimativa para o ponto TASIL.

Entre 1 h 35 min 53 s e 1 h 36 min 14 s, o controlador pede mais três vezes a estimativa para o ponto TASIL, sem resposta da tripulação. Não haverá mais contato entre a tripulação e os orgãos de controle.

As 1h55, o comandante de bordo desperta o segundo copiloto e diz “[…] vá assumir o meu lugar”.

Entre 1 h 59 min 32 s e 2 h 01 min 46 s, o comandante de bordo assiste a reunião entre os dois copilotos, onde PF disse principalmente que o pouco de turbulência que você acabou de ver […] devemos encontrar outras mais a frente […] estamos na camada, infelizmente não podemos subir muito mais agora porque a temperatura esta diminuindo menos rapidamente do que o esperado e que o acesso com Dacar falhou. O comandante de bordo deixou a cabine.

Fatos estabelecidos:

– A saída do comandante de bordo é feita sem recomendações operacionais claras

– A composição da tripulação estava em conformidade com os procedimentos da operadora

– Não havia repartição explícita das tarefas entre os dois copilotos

O avião se aproxima do ponto ORARO. Ele voa em nível de voo 350 e a velocidade Mach de 0,82; a inclinação longitudinal e de cerca de 2,5 graus. O peso e o centro de gravidade do avião são de cerca de 205 toneladas e 29%. O piloto automático 2 e autoimpulsão estão engajados.

– O peso e o centro de gravidade do avião estavam dentro dos limites operacionais

As 2 h 06 min 04 s PF chamou os PNC e lhes disse que “em dois minutos devemos atacar uma área onde deve haver um pouco mais de turbulência que agora e devemos tomar cuidado” e acrescenta “eu lhe lembrarei logo que sairmos de la”.

A 2 h 08 min 07 s ?PNF propõe “você pode, possivelmente, levar um pouco para a esquerda […]”. O avião começou uma ligeira virada para a esquerda; o desvio em relação a rota inicialmente seguida e de cerca de 12 graus. O nível de turbulências aumenta ligeiramente e eles decidem reduzir a velocidade para Mach 0,8.

– A tripulação havia identificado os ecos em seu radar meteorológico

– A tripulação executou uma alteração na direção de 12° à esquerda de sua rota

Fase 2 : da desconexão do piloto automático até o disparo do alarme de estol

As 2 h 10 min 05 s, o piloto automático e a autoimplusão são desativados e PF anuncia “eu tenho os comandos”. A aeronave rolou para a direita e PF exerce uma ação a esquerda e de elevação do nariz. O alarme de estol dispara duas vezes imediatamente. Os parâmetros registrados mostraram uma queda brutal de cerca de 275 kt para 60 kt da velocidade mostrada do lado esquerdo; poucos momentos depois a velocidade e mostrada no instrumento de resgate (ISIS).

– O piloto automático foi desativado quando o avião estava operando na camada superior de uma camada de nuvens ligeiramente turbulenta,

– Houve incoerência entre as velocidades medidas, presumivelmente como resultado da obstrução das sondas Pitot em ambiente de cristais de gelo.

– No momento da desconexão do piloto automático, o comandante de bordo estava descansando,

As 2 h 10 min 16 s, PNF disse “perdemos as velocidades” e “alternate law protections”.

A inclinação da aeronave aumenta gradualmente para acima de 10 graus e leva a uma trajetória ascendente.

– Apesar de ter identificado e anunciado a perda das indicações de velocidade, nenhum dos dois copilotos recorreu ao procedimento “IAS questionável”

– Os copilotos não tinham recebido treinamento para alta altitude do procedimento “IAS questionável” e sobre pilotagem manual

– Nenhum anúncio padrão de desvio em relação às atitudes e à velocidade vertical foi realizado.

PF exerce ações de pique e alternadamente da direita para a esquerda. A velocidade de subida, que atingiu 7.000 pés/min, diminuiu para 700 pés/min e a rolagem variou entre 12 graus a direita e 10 graus a esquerda. A velocidade mostrada a esquerda aumentou brutalmente para 215 kt (Mach 0,68).

– A deficiência da velocidade mostrada no PFD esquer do durou 29 segundos.

A aeronave se encontra então a uma altitude de cerca de 37.500 pés e a incidência registrada foi de cerca de 4 graus.

A partir de 2 h 10 min 50 s, PNF tentou por varias vezes chamar o comandante de bordo.

Fase 3 : do disparo do alarme de estol até o fim do voo

As 2 h 10 min 51 s, o alarme de estol soa novamente. As alavancas de controle de impulso são colocados no entalhe TO/GA e PF mantem sua ordem de elevar o nariz. A incidência registrada, de cerca de 6 graus no disparo do alarme de estol, continua a aumentar. O estabilizador horizontal regulável passa de 3 para 13 graus ao levantar o nariz em 1 minuto aproximadamente; ele permanecera nesta posição ate o fim do voo.

– A abordagem do estol foi caracterizada pela ativação do alarme seguida do apar ecimento do buffet

– Pouco depois da ativação do alarme de estol, PF aplicou impulso TO/GA e exerceu a ação de ele var o nariz

– Em menos de um minuto após a desativação do piloto automático, o avião sai de seu domínio de voo como resultado das acoes de pilotagem manual, predominantemente de elevar o nariz

– Até a saída do domínio de voo, os movimentos longitudinais do avião foram coerentes com a posição dos comandos

– Nenhum dos pilotos faz referência ao alarme de estol

– Nenhum dos pilotos identificou formalmente a situação de estol

Quinze segundos depois, a velocidade mostrada no ISIS aumenta abruptamente para 185 kt;

– A deficiência da velocidade mostrada no ISIS durou 54 segundos.

Ela e consistente com a outra velocidade registrada. PF continua a dar ordens de elevar o nariz. A altitude da aeronave atinge o seu máximo de cerca de 38 mil pés, sua inclinação e sua incidência são de 16 graus.

As 2 h 11 min 45 s, o comandante de bordo retorna a cabine. Em poucos segundos, todas as velocidades registradas se tornam invalidas e o alarme de estol para.

– O comandante de bordo entra na cabine cerca de 1 min 30 s após a desativação do piloto automático

– A incidência é o parâmetro que permite ativar o alarme de estol; se os valores de incidências forem inválidos, o alarme para.

– Pelo projeto, quando as medições de velocidade forem inferiores a 60 kts, os 3 valores de incidência são considerados inválidos.

– Cada vez que o alar me de estol é ativado, a incidência sup era o valor de seu limite teórico de ativação.

– O alarme de estol foi acionado de maneir a contínua durante 54 s.

A altitude esta, então, em cerca de 35.000 pés, a incidência ultrapassa a 40 graus e a velocidade vertical e de aproximadamente -10.000 pés/min. A inclinação da aeronave não excede a 15 graus e os N1 dos motores estão perto de 100%. O avião sofre oscilações de rolagem que chegam perto de 40 graus. PF exerce uma ação no manche no limite para a esquerda e de levantar o nariz, que dura cerca de 30 segundos.

– A incidência do avião não é apresentada diretamente aos pilotos.

A 2 h 12 min 02 s, PF disse “eu já não tenho nenhuma indicação”, e PNF disse “não ha nenhuma indicação que seja valida”.

Neste ponto, as alavancas de comando de impulsão estão no encaixe IDLE, os N1 dos motores estão em 55%. Quinze segundos depois, PF faz acoes de pique. Nos instantes que se seguem e constatada uma diminuição da incidência, as velocidades tornam-se novamente validas e o alarme de estol e reativado.

As 2 h 13 min 32 s, PF disse “vamos chegar ao nível cem”. Cerca de quinze segundos depois, acoes simultâneas dos dois pilotos nos minimanches são registradas e PF diz “vamos la, vocês tem os comandos”.

A incidência, quando e valida, ainda esta acima de 35 graus.

– Durante o voo, os movimentos dos comandos de profundidade e do PHR estavam coerentes com as ações do piloto.

– Os motores funcionaram e sempre responderam aos comandos da tripulação.

– Nenhum anúncio foi feito aos passageiros.

Os registros param as 2 h 14 min 28 s. Os últimos valores registrados são velocidade vertical de -10.912 pés/min, velocidade de solo de 107 kt, inclinação de 16,2 graus de elevação do nariz, rolagem de 5,3 graus a esquerda e um rumo magnético de 270 graus.

Não ha nenhuma mensagem de socorro emitido pela tripulação. Os destroços foram encontrados a 3.900 m de profundidade em 3 de abril de 2011 a 6,5 milhas náuticas e a norte-nordeste da ultima posição emitida pelo avião.”

FONTE: R7

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tplayer

Não entendo muito de pilotagem, mas pelo que já aprendi em simuladores fica óbvio que os copilotos fizeram exatamente o contrário do que deveriam ter feito.

Agora fica a pergunta: não seria culpa da AirFrance ter copilotos despreparados na tripulação de um voo internacional de longa duração?

asbueno

No caso da queda do Fokker 100 em Congonhas, em 1996, o reverso do motor direito abria e se fechava. Aos pilotos o que se mostrava era a maneteda direita recuando. A ação dos pilotos foi a de empurrá-la à frente. Com isso, soprando diretamente no dispositivo de reversão criou-se uma assimetria e o resultado foi a queda da aeronave de dorso Se não me engano foi isso. Uma das conclusões foi a de que os pilotos não haviam sido treinados para identificar aquela ação (redução da manete) como uma pane, o que levou a um gerenciamento errôneo da situação.… Read more »

Soyuz

Esta citação sobre o vôo 402 é perfeita. Neste acidente a tripulação foi responsabilizada por contrariar a doutrina de segurança de subir até 400 pés em condição monomotor e ai então procurar solucionar o recuo da manete do motor numero dois. Acontece que no calor da situação o raciocínio é outro. O Comandante Moreno decolou com a ciência de que o auto-throttle da aeronave apresentava falhas, o regulamento de segurança previa esta condição como normal. Então se coloquem por alguns segundos na posição do piloto, ele acaba de rotacionar o avião e uma manete de potencia recua de full para… Read more »

Franco Ferreira

Ninguém parece lembrar-se do outro (talvez o único) “tripulante” a bordo: o computador! Nem, parece, da propaganda da Airbus quando introduziu o “fly-by-wire”: O avião voa sozinho! O 1º avião caiu na cabeceira oposta, apesar de estar sendo demonstrado pela própria fábrica à imprensa. A propaganda também dizia que a aeronave não aceita “comandos bruscos” nem “incorretos”; e não estola. ‘Tá bom… Todos acreditam em Papai Noel! O registro do SSFDR registrou centenas de parâmetros durante 14.660 segundos. O que está registrado sobre a aeronave? Em que momento se soltou o leme vertical? Qual a atuação dos pedais durante a… Read more »

Tadeu Mendes

Os pilotos nao estao aqui para se defenderem.

Me parece muito extranho que os experientes piloto e co-piloto nao souberam como atuar.

Poderia sim, ter se formado uma confusao mental na cabeca deles, justamente por causa do information overload.

Eu pensava que o instinto para responder adequadamente a situacao fosse prevalecer devido a experiencia dos pilotos.

Mas mesmo assim, a Air France e a Airbus podem dizer o que bem quizerem porque os pobres pilotos nao estao aqui para refutar essas acusacoes.

sds.

Clésio Luiz

O Soyus disse tudo. Sem informações corretas não há como aplicar adequadamente o treinamento recebido. Colocando a culpa nos pilotos livra o pescoço de muita gente rica e importante dentro da Airbus e da Air France.

jacubao

É o velho ditado, “morto não fala”.

Tadeu Mendes

Jacubao, completando o seu pensamento de que “morto nao fala”, tambem deve ter corrido muita grana nas maos de muita gente.

O interessante e que a Air France “prefere” sacrificar a imagem de seus pilotos, do que encarar ao Consorcio (mafia) da Airbus.

VERGONHA….

Tadeu Mendes

Eu gostaria de lembrar (nao sei se comentei por aqui), de que tive acesso ao Relatorio (hard copy) dos dados transmitidos (Live) pela aereonave, para o QG da Airbus (talvez a Air France tambem recebeu). Enterrado no meo do jargao e das variaveis co-participantes nessa tragedia aeronautica; deu para concluir que (mesmo nao sendo um expert, pago para fazer esse tipo de analise, deu para concluir) houve um efeito cascata (ou em cadeia) em todo o sistema eletrico (e por conseguinte nos computadores de bordo), o que tirou das maos dos pilotos, toda a possibilidade de ganhar controle sobre a… Read more »

Vader

Muito estranho.

Ivan

O que não se pode esquecer é que a M&#$@ da sonda Pilot congelou… entupiu… falhou… e não foi a primeira vez…

Uma porcaria de peça que possivelmente custa menos que uma passagem aérea internacional, que vinha apresentando defeito de forma contumaz em outras aeronaves foi o ‘gatilho’ da tragédia.

Ivan, com pesar.

Justin Case

Amigos,

Este é o link para download do relatório final do voo 447, em francês:
http://www.bea.aero/docspa/2009/f-cp090601/pdf/f-cp090601.pdf
É um pdf de 26Mb, com 230 páginas.
Boa leitura.

Justin