O motor do Gripen pode ser testado no PAMA-SP? A FAB quer saber
Força Aérea já realizou estudo preliminar que indica viabilidade do atual banco de provas do PAMA-SP, apontando as melhorias necessárias, e iniciou o processo para contratar análise computacional de dinâmica de fluidos para prosseguir nos planos
O Parque de Material Aeronáutico de São Paulo (PAMA-SP) deverá realizar, no futuro, as provas dos motores F414-GE-39E que equipam os caças F-39 Gripen, atualmente sendo implantados no 1º Grupo de Defesa Aérea, Esquadrão Jaguar. Este é o planejamento da Força Aérea Brasileira e, para que se torne realidade, é preciso ter certeza de que o atual banco de provas do PAMA-SP (foto do alto, de dentro da câmara de ensaios com motor J85) pode realizar esses ensaios de motores
Conforme a Força Aérea Brasileira (FAB) recebe mais caças Gripen (imagem acima) e amplia a operação das aeronaves, algumas decisões para o futuro precisam ser tomadas já, visando o momento em que os primeiros exemplares alcançarão as horas de voo das inspeções nível parque. Nos atuais jatos F-5M, por exemplo, há inspeções de 600 horas e principalmente de 1.200 horas que demandam desmontagem das aeronaves e também a revisão dos motores.
Para estes últimos, após os serviços de manutenção, reparo e revisão (MRO na sigla em inglês), realizados por empresas especializadas como a GE Celma Avio, os motores precisam ser recebidos e testados, para só então serem instalados nas aeronaves.
Para isso, o Parque de Material Aeronáutico de São Paulo (PAMA-SP) conta com um banco de provas cujas origens remontam aos anos de 1940 e aos motores a pistão. As instalações foram ampliadas, duplicadas e modernizadas para, nas décadas seguintes, testar motores turboélice e depois os turbojatos e turbofans.
O banco de provas de motores a jato realiza esses ensaios nos GE-J85-21C que equipam os caças F-5M e nos MK 807 SPEY dos jatos de ataque A-1M. Também há outra câmara de testes para motores de helicópteros e turboélices (veja matéria específica sobre os bancos de prova ao final desta).
O desafio atual é saber se o atual banco de provas para motores turbojato e turbofan poderá testar os mais potentes F414-GE-39E (imagem acima). Para isso, a FAB realizou internamente um estudo preliminar e, agora, iniciou a seleção de fornecedor licenciado pela fabricante General Electric para um novo estudo, mais específico, com serviços de análise computacional de dinâmica de fluidos (CFD – Computational Fluid Dynamics) .
Para a seleção, a Força Aérea publicou no final de fevereiro uma chamada em inglês no site da Comissão Aeronáutica Brasileira em Washington, capital dos Estados Unidos (BACW, na sigla em inglês da organização da FAB). Também publicou Aviso de Licitação / Pregão no Diário Oficial da União (DOU) em 7 de março, em português, tendo como objeto a “contratação do serviço de análise de viabilidade do motor F414-GE-39E no Banco de Provas do PAMA-SP”, indicando o site da BACW para o edital completo.
Foi informada a data de abertura de 19 de março, terça-feira passada. O Poder Aéreo acessou o edital e traz alguns detalhes dos estudos, tanto o preliminar já realizado quanto o que será contratado.
Estudo preliminar
Como anexo ao edital, a BACW disponibilizou o estudo preliminar sobre os recursos e capacidades das instalações de provas de motores do PAMA-SP, visando a realização de ensaios do motor F414-GE-39E do F-39 Gripen. Trata-se de um estudo de 45 páginas feito em 2023, detalhando infraestrutura, sistemas elétricos, de combustível, ar comprimido, instrumentação e aquisição de dados, incluindo dados de certificação realizada há cerca de 10 anos para ensaios do motor MK 807 Spey, o mais potente entre os testados no banco de provas.
Não cabe aqui apresentar os inúmeros detalhes do estudo, apenas alguns pontos principais. Vamos a eles: o objetivo foi estabelecer as condições operacionais e a capacidade do banco de provas para os testes no motor do Gripen e, também, estabelecer as necessidades para testes e adaptações, relacionadas ao fluxo de ar na câmara para o novo motor.
Em especial, o estudo verificou se pode ser mantida a atual configuração do banco de provas ou se haveria necessidade de alterações significativas, com eventual remoção do bloqueio na torre de exaustão das instalações ou extensão da mesma.
O atual banco de provas para motores turbojato e turbofan está em operação desde 1972 e passa por manutenção preventiva periódica, sendo considerado uma instalação de grande robustez e capacidade para receber atualizações, segundo o estudo.
A maior parte de 22 itens analisados (como edificação, estruturas, bombas, motores elétricos, instrumentação, tubulações de combustível, compressores, sistemas de aquisição de dados etc) foi considerada em boas condições e com reutilização viável ou factível, com ressalvas específicas apontadas no estudo. Apenas 5 itens foram avaliados em condição moderada ao invés de boa, como vasos de pressão, controles, reservatórios de ar comprimido, iluminação e câmeras de supervisão, mas mesmo estes foram considerados viáveis / factíveis para reutilização.
As necessidades adicionais de avaliações e de reparos nos diversos itens foram listadas, assim como as especificações atuais dos mesmos. Nas imagens disponibilizadas no estudo, como a reproduzida abaixo, foi possível perceber a adição de novas telas e equipamentos computadorizados ao painel de controle, mais modernos que os vistos por este autor em visita ao banco de provas, há pouco mais de dez anos (veja fotos anteriores na matéria incorporada ao final desta).
Em resumo, o estudo concluiu que é factível testar os motores F414-GE-39E no banco de provas, desde que sejam realizadas algumas melhorias, consideradas de execução rápida. Em especial, melhorias nos sistemas de combustível e de ar comprimido das instalações.
O sistema de aquisição de dados (baseado na plataforma PXI da National Instruments) foi considerado bastante flexível e capaz de expansão. A localização das instalações de ensaios de motores no PAMA-SP, um dos maiores complexos de manutenção do país (junto à pista do Campo de Marte em São Paulo e contando também com o aeroporto de Cumbica / Base Aérea de São Paulo para a logística) também foi um item favorável considerado no estudo, assim como a existência de equipes técnicas dedicadas exclusivamente à operação e manutenção do banco de provas.
O estudo CFD que deverá ser contratado
O custo do novo estudo é estimado em 124 mil dólares e deverá ser contratado, pelo pregão, na modalidade de menor preço oferecido pelos concorrentes. Trata-se de uma análise computacional de dinâmica de fluidos (CFD) para atestar se a adaptação do banco de provas atual do PAMA-SP é factível para testes no motor F414-GE-39E do caça Gripen.
Segundo o edital, a análise CFD deverá ser feita por fornecedor licenciado pela empresa General Electric Aerospace, tendo em seus quadros um engenheiro especializado em câmaras de testes e uma equipe multidisciplinar, capaz de avaliar os vários aspectos e complexidades do projeto.
A visita do contatado ao PAMA-SP deverá durar no mínimo 2 dias, visando inspecionar e avaliar itens como as dimensões e condições da câmara de ensaios, a infraestrutura da tomada de ar e tubulação de exaustão, fluxo de ar e acústica, assim como os sistemas de combustível, de partida, a instrumentação, entre diversos outros. A visita deverá ser feita em até 6 semanas após a contratação e a entrega do relatório não poderá ultrapassar 90 dias após a visita.
Ou seja, se a contratação não demorar, antes do último trimestre deste ano a FAB saberá quais os trabalhos necessários para, enfim, realizar as adaptações e preparar o velho banco de provas do PAMA-SP ao novo desafio de testar os motores do Gripen. Afinal, na próxima década a imagem acima, de vários caças F-5 passando por inspeções e reparos no PAMA-SP, deverá dar lugar a uma linha de caças Gripen E/F, e não há tempo a perder.
Quer saber mais sobre ensaios de motores no PAMA-SP?
Veja matéria de 2011 do Poder Aéreo:
PAMA-SP: uma visita aos bancos de ensaios de motores
Fernando “Nunão” De Martini
Na edição 2011 do “Domingo Aéreo” do Parque de Material Aeronáutico de São Paulo (PAMA-SP), uma visita foi bem marcante para muita gente: as instalações dos bancos de ensaios de motores, com seus painéis mesclando instrumentos antigos e modernos, com suas câmaras blindadas ondem rugem os turbojatos, turbofans e turboeixos, com seu ar de lugar um tanto secreto, cuja finalidade não é perceptível para quem vê de fora um edifício aparentemente comum.
A foto do alto é do interior da câmara onde são ensaiados os motores a jato. Na ocasião, estava preso ao suporte um motor General Electric J-85, empregado no caça bimotor F-5 da FAB.
Para se ter uma ideia da dimensão da câmara, o motor está posicionado mais ou menos na altura de uma pessoa. Segundo os militares do PAMA-SP que monitoravam as visitas, esse banco de ensaios pode realizar os testes em motores de até 30.000 libras de empuxo.
Nas fotos abaixo, vê-se o túnel que recebe os gases de descarga das tubeiras dos motores. Esses gases geralmente alcançam temperaturas de 700ºC. O túnel diminui essa temperatura para 300ºC, assim como o ruído, antes de encaminhar esses gases a uma chaminé, onde são expelidos a temperaturas significativamente mais baixas.
Ainda segundo o pessoal do PAMA-SP, pouco ruído vaza para o exterior.
Andar calmamente por aquela câmara, com um motor a jato pendurado, faz pensar em como deve ser o mesmo lugar com o motor funcionando a pleno, com a pós-combustão ligada. Certamente o lado de fora do recinto é bem melhor e mais seguro, pois é bem fácil perceber a grossura das paredes da câmara, assim como as portas que as separam das salas de monitoramento.
Janelas com vidros múltiplos garantem o isolamento acústico e, assim como as paredes, a proteção dos técnicos que monitoram o funcionamento dos motores. No caso de uma eventual explosão, esta ficaria restrita à câmara.
No painel das fotos acima, que fica instalado numa sala ao lado da câmara (reparar na janela ao lado do painel, que pode ser vista também nas fotos mais acima, para comparação) são verificados os diversos parâmetros de funcionamento dos motores a jato, em mostradores específicos.
Câmeras de alta resolução captam imagens dos motores, de modo a mostrar detalhadamente, nos monitores do painel, problemas como vazamentos, por exemplo.
Em outra câmara, servida por outra sala de monitoramento, são ensaiados os motores turboeixo, que equipam aeronaves de asa fixa dotadas de propulsão a hélice e helicópteros. Na ocasião estava sendo testado o motor Lycoming T-53 de um helicóptero UH-1H (o popular “Huey”, ou “Sapão”).
O painel é bem mais antigo que o utilizado para os testes dos motores a jato (segundo o pessoal que o opera, remonta em boa parte à década de 1940), mas cumpre seu papel normalmente. A principal diferença em relação aos itens monitorados dos motores a jato, é que esse banco de ensaios mede também o torque, que é uma característica dos motores turboeixo.
Com alguma frequência, circulam informações sobre uma possível desativação futura do PAMA-SP, com suas funções sendo absorvidas por empresas privadas ou tendo seus equipamentos, maquinário e pessoal transferidos para um novo parque, que centralizaria atividades realizadas pelo PAMA-SP e por outros PAMAs da FAB.
Uma visita à grande instalação que é o Parque de Material Aeronáutico de São Paulo mostra que essa mudança seria uma tarefa bastante complexa, com custos não desprezíveis. E quem penetra nos segredos dos bancos de ensaios de motores, com suas grossas câmaras e equipamentos pesados, percebe que esta deve ser uma instalação de transferência bem difícil.
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