F-4C Phantom II da USAF

… e agora diz o mesmo do F-35

Os primeiros F-4 no Sudeste Asiático eram pintados de cinza, mas em 1966 eles foram camuflados como o Phantom que aparece na parte inferior da fotografia (Foto da Força Aérea dos EUA)

* tradução e adaptação: Guilherme Poggio

O combate aéreo de curto alcance (conhecido como dogfight) não deveria acontecer. Em 20 de maio de 1967, oito caças McDonnell F-4C Phantom II da Força Aérea dos EUA (USAF) estavam patrulhando sobre o Vietnã do Norte quando avistaram cerca de 15 caças inimigos MiG-17 a uma curta distância.

A baixa altitude dos MiG e o nevoeiro impediram que os F-4 detectassem os jatos norte-vietnamitas de longe.

Mergulhando para atacar, os bimotores F-4 dispararam uma salva de 24 mísseis AIM-7 Sparrow e AIM-9 Sidewinder, abatendo apenas quatro dos MiG. Os jatos norte-vietnamitas reagiram rapidamente, formando uma “roda de carroça”, com cada piloto observando a cauda do homem à sua frente.

Pilotos norte-vietnamitas e seus MiG-17, primeiro esquadrão do 923rd FR: Luy Huy Chao (6 kills), Le Hai (7 kills), Mai Duc Tai (2 kills), e Hoang Van Ky (5 kills – KIA 5 June 1967). Estes pilotos derrubaram um F-4 Phantom em 24 de junho de 1967 e um F-105 no dia seguinte.(Vietnamese News Agency)

Enquanto os pesados F-4 tentavam ultrapassar os ágeis MiG, um piloto norte-vietnamita crivou de projéteis um dos aviões americanos com tiros de canhão, incendiando-o e forçando os dois tripulantes a se ejetarem.

“A capacidade de manobrar do MiG-17 era fantástica”, lembrou um dos pilotos do F-4 . “Só vendo para acreditar.”

Mas a Força Aérea havia assumido que isso não seria um problema – que seus então novos F-4 bipostos jamais entrariam em um dogfight. Em vez disso, os F-4 – e outros caças da Força Aérea e da Marinha dos EUA – sempre destruiriam seus inimigos de longo alcance, usando o Sparrow e outros mísseis ar-ar.

Era uma suposição errônea e perigosa que fez com que dezenas de aviadores americanos fossem abatidos sobre o Vietnã. Mas 49 anos depois, a Força Aérea está fazendo a mesma afirmação em relação ao seu novo caça furtivo, o F-35.

Em janeiro de 2015, a USAF colocou um novíssimo F-35A contra um F-16D com 25 anos de idade em combate aéreo simulado. O F-35 mostrou-se muito lento e moroso para derrotar o F-16 num dogfight, de acordo com o relatório da época.

Mas a Força Aérea disse que não é preciso se preocupar. “A tecnologia do F-35 foi projetada para engajar, atirar e eliminar seu inimigo a partir de longas distâncias, não necessariamente em situações visuais como os dogfight”.

Parece familiar.

A fé da Força Aérea na guerra aérea de longo alcance provou ser desastrosa no Vietnã. Há boas razões para acreditar que será igualmente desastroso na primeira vez que esquadrões de novos F-35 voarem em combate contra um inimigo determinado.

Nas primeiras quatro décadas da história do combate aéreo, aviões lutaram entre si com o uso apenas de canhões ou metralhadoras (armamento de tubo). Então, em 1946, o engenheiro da Marinha William Burdette McLean começou a trabalhar em um míssil com guiagem por calor (infravermelho) denominado “Sidewinder”, o primeiro míssil ar-ar efetivo.

Doze anos depois, Washington equipou os caças F-86 de Taiwan com os primeiros Sidewinder prontos para o combate. Em batalhas aéreas no Estreito de Taiwan os F-86 derrubaram os MiG-17 chineses comunistas – e aparentemente mudaram a guerra aérea para sempre. Em breve, novos e melhores mísseis – alguns com orientação por radar – foram lançados de laboratórios em todo o mundo.

A Força Aérea e as outras forças adotaram entusiasticamente a era dos mísseis, até mesmo retirando os canhões internos de muitos de seus novos projetos de aviões de guerra, incluindo os primeiros F-4C.

A nova tecnologia de mísseis coincidiu com uma mudança na doutrina. O Pentágono decidiu que nas guerras futuras, os caças a jato subiriam alto e voariam rapidamente para atingir os bombardeiros soviéticos de longo alcance, lutando para atingi-los de longe antes que eles lançassem suas bombas atômicas.

Os jatos americanos da época eram poderosos, mas não tinham agilidade. “Nossos caças táticos foram projetados principalmente para a guerra nuclear, onde a penetração era mais importante do que a capacidade de manobra”, escreveu o general da Força Aérea Bruce Holloway em 1968 na Air University Review.

Mas a próxima guerra que os EUA travariam não foi o Armagedom global com os soviéticos. Em vez disso, tropas dos EUA juntaram-se às forças armadas do Vietnã do Sul e lutaram contra uma insurgência comunista apoiada pelo exército e pela força aérea do Vietnã do Norte.

Os planejadores militares americanos apostaram em uma guerra de alta tecnologia, elétrons, foguetes e números altos de Mach durante os voos em linha reta. O que os esperavam eram combates aéreos em baixa velocidade (para um caça a jato), de muitos giros e sobre o dossel da floresta. Não demorou muito para que a Força Aérea e a Marinha percebessem que sua tecnologia e sua tática não funcionavam muito bem contra os MiG de Hanói.

Entre 1965 e 1968, caças americanos lançaram 321 mísseis guiados por radar sobre o Vietnã. Pouco mais de oito por cento atingiram seus alvos, de acordo com uma análise feita em 2005 pelo tenente-coronel da Força Aérea, Patrick Higby.

A Marinha se esforçou para analisar a terrível taxa de acerto. “A principal razão para o fraco desempenho de combate dos sistemas de mísseis ar-ar no Sudeste Asiático, menor do que o desejado, foi a otimização do projeto para um engajamento de alta altitude contra um alvo grande e pouco manobrável” em um relatório de 1968.

Com um pouco de antecedência, um MiG-17 poderia se evadir de um míssil – e então usar a mesma manobrabilidade para entrar na cauda do jato americano.

O Pentágono atualizou os mísseis Sparrow e Sidewinder e adicionou um canhão à nova versão “E” do F-4. E os pilotos receberam treinamento para combates do tipo dogfight.

Logo, as vitórias aéreas melhoraram e perdas de tripulações diminuíram. Mas o que os Estados Unidos realmente precisavam era de um caça novinho em folha – um que não se sobressaísse apenas em uma luta estreita e de longo alcance.

A América precisava de um “dogfighter”.

Um F-16 demonstra seu raio de curva em comparação com um F-4E Phantom

“Relação peso/potência tremendamente melhorada, baixa carga alar, alta velocidade Mach e teto operacional elevado, capacidade de ascensão superior, aceleração e giro em todo o envelope de voo”, assim Holloway descreveu rapidamente as características do novo jato em 1968.

“Avançados aviônicos e armamentos, que fornecerão as habilidades necessárias para derrotar qualquer adversário previsto com uma grande variedade de armas, incluindo mísseis e armas”, acrescentou Holloway.

O resultado foi o bimotor F-15, que estreou em 1972 e 43 anos depois [o texto foi escrito em 2015] ainda é o mais numeroso caça de superioridade aérea da Força Aérea. Anos depois surgiu o F-16, que também poderia combater em qualquer condição, voar rápido e girar rapidamente, lançar mísseis e canhões.

Os projetistas do F-15 e do F-16 não os otimizaram para cenários de guerra fantasiosos e idealizados. Eles os otimizaram para nosso próprio planejamento imperfeito, para circunstâncias incertas – em outras palavras, para o mundo real.


O que só se tornou mais importante à medida que o design dos caças russos/soviéticos progrediu. Os MiG-17 deram lugar aos rápidos MiG-21 e, mais tarde, aos MiG-29 e Su-27 altamente manobráveis. O Su-35 de hoje – um Su-27 altamente redesenhado – pode voar mais rápido e virar melhor que um F-15 e carrega mais armas e possivelmente melhores.

Cada vez menos, a América chega a ditar os termos da guerra aérea. Cada vez mais, o Pentágono precisa de caças que possam “caçar”.

Mas o novo F-35, que deve se tornar o principal avião de guerra da Força Aérea, é “substancialmente inferior” em uma batalha decisiva até mesmo para um F-15, de acordo com o teste de janeiro de 2015. A Força Aérea insiste que não há problema, porque o furtivo F-35 evitará a detecção e atingirá os aviões inimigos a longa distância.

Em outras palavras, a Força Aérea insiste que pode ditar os termos dos engajamentos do F-35.

Talvez isso seja parcialmente verdadeiro se todas as propriedades furtivas do F-35 realmente funcionarem. Talvez seus mísseis não percam o tempo todo. Talvez a Rússia não exporte o Su-35 para todos os compradores interessados. Talvez os Estados Unidos nunca travem uma guerra em larga escala contra um inimigo de alta tecnologia que pode negar as poucas vantagens que o F-35 possui.

Mas e se as projeções otimistas do governo estiverem pouco fora do alvo? E se algo não funcionar perfeitamente e os pilotos do F-35 se encontrarem em combates aéreos de curto alcance com caças com perfis semelhantes aos Sukhois ou MiGs de fabricação chinesa? E se nós enviarmos um caça que não pode curvar rapidamente em batalha com caças que podem?

Já aconteceu antes com aviões de combate da Força Aérea que nunca deveriam travar dogfight. E um bando de tripulantes de F-4 pagou pela fé cega do governo em uma guerra aérea de longo alcance, em linha reta, com sua liberdade … ou com suas vidas.

NOTA DO EDITOR O texto foi originalmente publicado em inglês no ano de 2015 pelo site “war-is-boring“.

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