KC-390 em produção

Características Gerais e Dinâmica Concorrencial

A indústria aeroespacial é uma das mais importantes dentro da estrutura produtiva das economias avançadas, particularmente da economia norte-americana. Esta importância decorre tanto do seu caráter estratégico, no domínio das tecnologias sensíveis e na produção de equipamentos de defesa, como dos seus aspectos econômicos: geração de saldos comerciais, elevado valor adicionado e empregos de alta qualificação. Desta maneira, a indústria aeroespacial apresenta características bastante específicas, que são apresentadas a seguir:

1. Científico e Tecnológico-Intensiva: a contínua e crescente introdução de tecnologia de ponta, possibilitando a criação de produtos de altíssimo valor adicionado, é o principal fator de competitividade na indústria aeroespacial. Desta forma, a infraestrutura de apoio às atividades científicas de pesquisa e desenvolvimento, formada pelas universidades e, principalmente, por centros de pesquisa, apresenta uma importância singular para o desenvolvimento da indústria aeroespacial. Entretanto, os grandes conglomerados aeroespaciais têm crescentemente incorporado intrafirma as atividades de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), particularmente nos setores aeronáutico e de defesa. No setor espacial, a quase totalidade das atividades científicas é realizada pelos laboratórios públicos, em geral subordinados às agências espaciais. Por fim, cabe destacar que a pesquisa científica e tecnológica realizada na indústria aeroespacial apresenta uma natureza dual, na qual coexistem características militares e civis, que se retroalimentam.

2. Complexidade Tecnológica: os produtos dessa indústria, sejam aeronaves, foguetes, mísseis ou satélites, na realidade são sistemas integrados que compreendem um conjunto de componentes e subsistemas projetados para se adequarem uns aos outros. Esta elevada complexidade, por um lado, permite que a indústria aeroespacial incorpore, de forma contínua e crescente, as inovações tecnológicas originadas em outras indústrias, como a mecânica, eletrônica e a química. Por outro lado, as elevadas exigências impostas pela indústria aeroespacial permitem um alto nível de difusão das inovações tecnológicas para outros setores da economia.

3. Conglomeração: observa-se a constituição de grandes conglomerados que englobam os setores aeronáutico, defesa e espaço, de forma que a indústria aeroespacial pode ser classificada como um oligopólio concentrado em nível mundial. Estes conglomerados tornaram-se o tipo de estrutura organizacional predominante, demonstrando que a construção de vantagens competitivas nessa indústria passa, necessariamente, pelo tamanho da empresa.

4. Controle Nacional: apesar da atuação global, o caráter nacional dos conglomerados aeroespaciais não apenas permanece, como foi reforçado. Desta maneira, a maioria dos países tem evitado a desnacionalização de suas empresas; buscando, ao contrário, transformá-las em grandes conglomerados aeroespaciais que possam enfrentar a acirrada competição mundial. Mesmo no caso de empresas ditas multinacionais, como a européia EADS, o caráter nacional permanece, ainda que de forma compartilhada.

5. Parcerias: a contínua incorporação de avanços científicos e tecnológicos que se reflete em crescentes custos de desenvolvimento de novos produtos tem levado as indústrias aeroespaciais dos diferentes países a se associarem no desenvolvimento dos novos projetos. O maior exemplo disto é a construção da Estação Espacial Internacional, que envolve, as até então rivais, agências espaciais russa (Roskosmos) e norte-americana (NASA), além da participação das agências européia (ESA), canadense (CSA) e japonesa (JAXA).

6. Presença do Estado: observa-se que o Estado é o grande agente coordenador da indústria aeroespacial, não apenas nos setores em que o controle é direto, como o militar e o espacial, mas também nos segmentos comerciais. Na China, Rússia e Índia a coordenação é direta, pois a indústria aeroespacial é estatal. No caso da Europa os diferentes Estados nacionais têm atuado de forma conjunta, buscando a criação e o desenvolvimento de uma indústria aeroespacial de caráter regional. Nos EUA, a coordenação tem sido feita, na maioria dos casos, através das concorrências públicas para os setores militar e espacial, que, aos poucos, foram selecionando as empresas vencedoras. Por fim o Canadá, onde a coordenação se dá através do apoio ao desenvolvimento tecnológico.

Apesar das grandes diferenças existentes entre os setores que compõem esta indústria (aeronáutica, defesa e espaço), o padrão de concorrência de todos eles está centrado na contínua introdução de inovações tecnológicas e nas condições de financiamento destas inovações.

A introdução de inovações tecnológicas propicia o surgimento de um novo “projeto dominante” que rompe com a trajetória tecnológica então vigente, obrigando as empresas concorrentes a adotar estas modificações, com o risco de não mais permanecerem no mercado. Mesmo no caso das inovações incrementais, que não implicam num rompimento da trajetória vigente, a sua adoção significa um importante elemento de diferenciação frente às demais empresas. Desta maneira, a indústria aeroespacial é marcada por um elevado dinamismo tecnológico, que continuamente revoluciona as estruturas desta indústria a partir de dentro.

Por outro lado, a crescente complexidade tecnológica, que se reflete nos elevados custos de desenvolvimento de novos produtos, também tem, continuamente, elevado as necessidades de escala mínima para operação na indústria aeroespacial. Desta forma, as últimas três décadas foram marcadas por um amplo processo de reestruturação patrimonial: fusões, aquisições e associações, que levaram a uma crescente concentração nesta indústria.

Entretanto, estas operações patrimoniais, que vinham desde o Pós-guerra, não apenas se intensificaram nas últimas décadas, como também ampliaram o escopo. O processo de concentração não ficou restrito às empresas de um determinado país ou de um determinado setor. Atualmente, a indústria aeroespacial está estruturada como um oligopólio concentrado em nível mundial, onde apenas um pequeno número de atores globais — global players — passa a ter condições de operar nessa indústria.

Assim, a indústria aeroespacial está assentada sobre dois movimentos aparentemente antagônicos, o dinamismo e a concentração, mas que, na realidade, se reforçam mutuamente. O elevado nível de maturidade dessa indústria faz com ela apresente uma estrutura muito mais estável, apesar do alto grau de dinamismo existente. Na indústria aeroespacial, a grande empresa é, ao mesmo tempo, causa e conseqüência do elevado dinamismo tecnológico.

FONTE: Perspectivas do Investimento em Ciência — Instituto de Economia da UFRJ/Instituto de Economia da UNICAMP, 2009

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