Dethlefsen e Gilroy no seu Wild Weasel F-105F

Major John Revak (esquerda), piloto e major Stan Goldstein (direita), EWO – US Air Force photo

Para sobreviver e completar suas missões, os pilotos (apelidados de “nose gunners” – artilheiros de nariz) e os EWOs (apelidados de “bears” – ursos) tinham que trabalhar juntos como um só. Assim, existia uma relação especial entre as equipes individuais Wild Weasel. Emparelhados no início de seu treinamento, eles geralmente se deslocavam e voavam juntos em turnês de combate.

A experiência do major John Revak, piloto e do major Stan Goldstein, EWO, representa a proximidade e o trabalho em equipe compartilhados pelas tripulações de Wild Weasel.

Os majores Revak e Goldstein voaram sua 100ª missão em 25 de novembro de 1968. Notavelmente, eles voaram juntos todas as 100 missões “para o norte” (as tripulações de Wild Weasel geralmente voavam muitas, mas não todas, missões juntas).

Majores John Revak e Stan Goldstein

Suporte de ataque: primeiros a entrar, último a sair
Em missões de apoio de ataque no Vietnã do Norte, Wild Weasels iam à frente das forças de ataque para suprimir os sites de SAM e os radares que direcionavam AAA na área alvo. Idealmente, os Wild Weasels os destruíam, mas só o fato de intimidar os radares obrigando-os a desligar e mantê-los assim também cumpria a principal missão de proteger a força de ataque. Para completar a missão, os Wild Weasels se mantinham altruisticamente entre as defesas inimigas e a força de ataque. Eles permaneciam na área até que a força de ataque tivesse ido embora — daí o lema “First In, Last Out”.

Caçar e destruir: provocando os SAMs
O outro tipo de missão Wild Weasel, caça e destruição, envolvia a caça de SAMs para destruí-los como uma missão primária. Normalmente voando na parte sul do Vietnã do Norte, os Wild Weasels provocavam os sites de SAM, agindo como isca para tentá-los a disparar. Quando um site de SAM disparava, a fumaça reveladora e a poeira criada pelo lançamento dos SA-2 mostravam visualmente sua localização exata. Depois que os Wild Weasel manobravam para escapar dos mísseis com um “SAM break”, eles ou outras aeronaves atacavam e destruíam o site de SAM.

Um F-105 Thunderchief tenta escapar de um SAM

Enfrentando os SAMs
1. Quando a luz de advertência e a campainha de alerta de SA-2 eram disparadas no painel do avião, o comandante do F-105 chamava “take it down” no rádio. Ambos os tripulantes olhavam para fora a fim de localizar a fumaça e o pó do lançamento do SA-2, para ver de onde o míssil estava vindo. Ao mesmo tempo, o piloto girava a aeronave, empurrando a manete para aumentar a velocidade e mergulhava a aeronave para baixo a fim de ganhar mais velocidade, voltando-se na direção do SA-2.

2. Continuando a mergulhar, o piloto empurrava a aeronave na posição vertical com o nariz para baixo. O SA-2 subia e acelerava durante seu estágio de impulso de seis segundos, depois deixava cair a seção do booster, disparava seu foguete sustentador e começava a fase de orientação.

3. O piloto continuava a mergulhar, mantendo o míssil à frente e ligeiramente para um dos lados da aeronave. Ambos os tripulantes observavam atentamente o SA-2 à medida que ele se aproximava. Até agora, o míssil estava apontando o nariz para baixo enquanto se guiava.

4. No momento preciso, o piloto puxava a aeronave para uma subida abrupta. O SA-2, viajando quase duas vezes mais rápido, não podia girar tão rapidamente e acabava se perdendo  (o SA-2 não conseguia fazer um segundo ataque). Se o piloto puxasse a manobra alguns instantes mais cedo ou mais tarde, a ogiva de 144 kg do míssil encontrava seu alvo.

Norte-vietnamitas preparando um SA-2

Gato e rato
À medida que os Wild Weasel recebiam melhores equipamentos e aprimoravam suas táticas, as equipes inimigas de SAM constantemente faziam mudanças táticas para contorná-los. Por exemplo, para evitar serem rastreados pelos Wild Weasels, eles lançavam SAMs sem ligar o radar de orientação, apenas ligando a orientação quando o míssil se aproximava de uma formação. Eles começaram também a disparar os mísseis SA-2 em salvas de três, tornando os mísseis mais difíceis de evitar. Outra tática foi simular eletronicamente os lançamentos, que faziam disparar a luz de aviso de lançamento no avião Wild Weasel, forçando-o a fazer uma manobra “SAM break” prematura.

F-105F Wild Weasels com mísseis Shrike

Determinação altruísta em Thai Nguyen: capitães Merlyn Dethlefsen e Mike Gilroy

Em março de 1967, a Operação Rolling Thunder já tinha dois anos, sem sinais de que o Vietnã do Norte recuasse. Os Estados Unidos e o Vietnã do Norte se engajaram em uma escalada gradual do conflito. À medida que os ataques aéreos dos EUA aumentaram, o regime de Hanoi aumentou suas defesas antiaéreas de AAA para mísseis superfície-ar SA-2 mais mortíferos, além de caças MiG.

Os céus do Vietnã do Norte se tornaram os céus mais perigosos e difíceis para os pilotos americanos desde a Segunda Guerra Mundial. No início da Rolling Thunder, a supressão de defesas era atribuída aos F-100F Super Sabres bipostos.

O F-100 foi uma solução provisória para o papel de Wild Weasel, no entanto, não tinha uma boa carga útil e não era rápido o suficiente para acompanhar os F-105 Thunderchiefs que estavam dividindo o ônus das missões de ataque. Em junho de 1966, os primeiros F-105 Thunderchief Wild Weasel chegaram ao Sudeste Asiático.

F-105F Wild Weasel decolando para uma missão

Uma das unidades Wild Weasel na época era o 354th Tactical Fighter Squadron (TFW) baseado na Royal Thai Air Force Base (RTAFB) Takhli, que era o lar dos F-105 da 355th Tactical Fighter Wing. O 355th TFW estava operando o Thunderchief desde 1962 em McConnell AFB, no Kansas, antes de ser desdobrado para a Rolling Thunder. Como os F-100Fs, os Wild Weasel F-105F tinha dois tripulantes, o piloto na frente e o oficial de guerra eletrônica atrás, o EWO ou “Bear”.

Em 10 de março de 1967, o portfólio de alvos foi finalmente expandido para incluir as grandes siderúrgicas Thai Nguyen. A área era o centro da indústria pesada do Vietnã do Norte e a única usina siderúrgica (na verdade, foi a primeira usina siderúrgica na Indochina, tendo iniciado a produção em 1959) e, durante a maior parte dos dois primeiros anos da Operação Rolling Thunder, permaneceu fora da lista de alvos por razões políticas.

Dethlefsen e Gilroy no seu Wild Weasel F-105F

Um grande pacote de Thunderchief composto por F-105D monopostos e Wild Weasel F-105F bipostos para supressão de defesas foi enviado contra a siderúrgica pela 355ª TFW da RTAFB Takhli. Uma esquadrilha de Wild Weasels com o indicativo de chamada “Lincoln” foi parte deste pacote de ataque neste dia. À medida que os Wild Weasels se aproximavam de Thai Nguyen, o EWO do líder da Lincoln travava em um site SAM e um míssil AGM-45 Shrike foi disparado, mas errou o alvo. O site SAM, no entanto, não errou, e em um curto espaço de tempo, o líder da Lincoln, juntamente com dois F-4 Phantoms que faziam a escolta, foram derrubados.

O Lincoln 02 recebeu dano de AAA e teve que se retirar e voltar avariado até Takhli. Isso deixou apenas dois Wild Weasels na área, o Lincoln 03 pilotado pelo major Merlyn Dethlefsen e seu Urso, capitão Kevin Gilroy, e seu ala, o major Ken Bell no Lincoln 04, monoposto. Enquanto Dethlefsen e Gilroy atacavam o site de SAM, dois MIG-21 da VNAF entraram na luta, alcançando a posição 6 horas do avião de Dethlefsen.

AAA no Vitenam e sombra de um F-101 Voodoo de reconhecimento

O Lincoln 03 disparou seu míssil Shrike e imediatamente puxou o F-105F carregadamente pesado em uma curva fechada, fazendo com que os mísseis dos MiG-21s atacantes escapassem e se perdessem. Arriscando que os MiGs não o seguiriam na zona de antiaérea AAA que protegia o site de SAM, Dethlefsen continuou em vez de soltar suas bombas e fugir, como era a prática quando encontravam MiGs — para a VNAF, conseguir fazer um Thunderchief abandonar suas bombas era tão bom quanto derrubá-lo, pois não seria capaz de realizar seu ataque. Com certeza, os MiGs não o seguiram sobre a AAA e à baixa altitude, Dethlefsen acionou o pós-combustor para recuperar a altitude. Assim que ele alcançou a posição para acertar o site de SAM, outro par de MiGs fechou e abriu fogo no Lincoln 03 e Lincoln 04. Ambos foram atingidos por canhão de 37mm, mas ainda continuaram voando.

Com os últimos F-105Ds de ataque e os Phantom de escolta se afastando da área, Dethlefsen sabia que a previsão do tempo era boa para os próximos dias e que a fábrica de aço Thai Nguyen estava há muito tempo na lista de desejos dos pilotos. Embora ele estivesse no seu direito pelo procedimento da USAF de seguir com o resto das aeronaves e deixar a área para Takhli, Dethlefsen decidiu fazer outro ataque ao site de SAM, pois sabia que seus colegas pilotos estariam retornando nos próximos dias.

Merlyn Dethlefsen seu EWO, Kevin Gilroy

Liderando seu ala, Dethlefsen escaneou o padrão de AAA de uma altitude segura, enquanto Kevin Gilroy agindo como seu EWO obteve um sinal do site de SAM com a eletrônica do Wild Weasel. Assim que Gilroy identificou o site, eles dispararam seu míssil Shrike para eliminar o radar de orientação. Dethlefsen então conduziu seu wingman para baixo na zona de AAA para colocar o site de SAM fora de operação. Obtendo o visual do site, Dethlefsen lançou sua carga de bombas no alvo e depois puxou seu avião para fora. Para obter um seguro adicional, ele girou seu Thud danificado em um flip reverso, selecionou o canhão Vulcan de 20mm e varreu o alvo. Depois ele levou seu F-105F para fora da zona alvo e se conectou a um avião-tanque KC-135A no caminho de volta para Takhli.

Major Merlyn H. Dethlefsen: Medalha de Honra

Por seu desempenho na missão, Dethlefsen recebeu a Medalha de Honra, pois pelo procedimento da USAF, ele deveria ter abandonado a área com o pacote de ataque — mas, em vez disso, decidiu realizar outro ataque no site de SAM.

Dethlefsen não era ingênuo. No dia desta missão, ele já tinha 72 missões de combate Wild Weasel, mas sabia que se o site não fosse nocauteado, provavelmente ele dispararia nas equipes nos dias seguintes.

E este não era apenas qualquer alvo —  era um bem precioso para os norte-vietnamitas e era fortemente defendido. Mais aeronaves americanas foram derrubadas em 1967 do que em qualquer outro ano da Guerra do Vietnã. Os céus sobre Thai Nguyen não eram um bom lugar para um piloto americano naquele dia, mês e ano. Adicione a isso o perfil de missão Wild Weasel, que expunha suas equipes ao fogo hostil mais do que a maioria dos pilotos.

Merlyn Dethlefsen nasceu em 1934 em uma fazenda em Iowa e ele se juntou à USAF em 1954, através do Programa de Cadetes da Aviação. De 1957 a 1959, serviu como navegador no Douglas C-124 Globemaster II da Dover AFB, antes de se reportar ao treinamento de voo de graduação.

Sua primeira tarefa operacional depois de conquistar suas asas foi voar F-100 Super Sabres na Alemanha, antes da transição para o Thunderchief F-105 em 1965. Após sua missão de Medalha de Honra (seu “Urso” EWO, Kevin Gilroy, ganhou a Cruz da Força Aérea para essa missão), ele completou sua turnê de 100 missões no Vietnã.

Mais tarde, ele trabalhou como diretor de operações na Ala de SR-71 em Beale AFB, na Califórnia, e na Ala de B-52 na Dyess AFB, no Texas. Dethlefsen faleceu em 1987 e seu corpo sepultado no Cemitério Nacional de Arlington.

VEJA NA QUINTA PARTE: mais missões e novas armas para os Wild Weasel

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Clésio Luiz

Existe alguma análise sobre a sobrevivência dos F-105 voando as mesmas missões de ataque do F-4, incluindo as wild weasel? E se o F-4 mostrou maior índice de sobrevivência. isso foi devido a aeronave ou aos procedimentos da missão?

Leandro Costa

Clésio, talvez tenha algo por aí sobre isso sim, mas meu chutômetro diz que não seria tão interessante. Os F-105 cumpriram funções Weasel até o final da Guerra, enquanto os F-4 os substituíram nas outras funções de ataque após a Rolling Thunder. Houve maior sobrevivência dos F-4 sim, mas ao mesmo tempo houve também diversas mudanças em procedimentos, equipamentos e táticas. As capacidades de plataforma ajudaram um pouco nisso sim, sendo o F-4 uma aeronave mais capaz no quesito geral, inclusive numa das coisas que os pilotos mais apreciavam, justamente aceleração e velocidade, que os ajudavam à escapar de SAMs… Read more »

ednardo ferreira

Uma coisa é certa: os caras em machos pra caramba.