Governo militar cancelou concessão da Panair e decretou sua falência, em 1965

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Panair

Com sede no Rio, 7 mil funcionários e símbolo da aviação comercial brasileira, companhia, então a maior do setor no país, era comandada por executivos ligados a JK e Jango

Gustavo Villela

ClippingNEWS-PATrês dias, com escalas e pernoites. Esse era o tempo que levava a viagem entre Belém e o Rio de Janeiro no primeiro avião da Panair do Brasil, o Sikorsky S-38. A aeronave da companhia, que iniciava suas atividades em 22 de outubro de 1929, era uma novidade e fazia grande sucesso na época. O hidroavião, depois apelidado pelos cariocas de “Tamanco Voador”, fazia o transporte de correio e carga e, um pouco mais tarde, de passageiros. Três décadas depois, a empresa, uma das pioneiras da aviação comercial brasileira, chegava ao fim. Há 50 anos, no dia 10 de fevereiro de 1965, o governo militar cancelava a concessão da Panair, então a maior do setor no país, abrindo o caminho para a decretação da sua falência.

Após encontro do ministro da Aeronáutica, brigadeiro Eduardo Gomes, com o presidente Castelo Branco, o primeiro general a comandar o país na ditadura, o governo anunciou o cancelamento das concessões da Panair do Brasil, dadas a “título precário”, para explorar linhas nacionais e internacionais. Alegou que a situação financeira da companhia era irrecuperável. Seus aviões foram recolhidos aos hangares, e a Varig passou no mesmo dia a operar voos internacionais da empresa, enquanto as rotas nacionais seriam assumidas pela Cruzeiro. Sua falência foi decretada apenas cinco dias depois, em 15 de fevereiro, pelo juiz Mario Rebelo Mendonça Filho, da 6ª Vara Cívil do Rio, com base em informações do Ministério da Aeronáutica e desprezando o pedido de concordata apresentado pela diretoria.

Para críticos da operação, entre eles ex-funcionários e executivos da empresa, a decretação da falência foi uma arbitrariedade jurídica no regime militar, resultado de perseguição política. Alguns também a consideram uma ação orquestrada entre militares e a Varig, que assumiu as suas linhas para o exterior e parte dos seus ativos. Com cerca de 7 mil funcionários e sede na Praça Marechal Âncora, no Centro do Rio, a Panair do Brasil viveu também crises internas, incluindo greve de pilotos e a abertura de uma CPI na Câmara dos Deputados. A crise final começou em 1964, quando o governo retirou as subvenções para as rotas internas da companhia.

A empresa foi criada como subsidiária de uma empresa americana, a Nyrba (New York-Rio de Janeiro-Buenos Aires). Um ano depois, em 1930, foi incorporada pela Pan Am (Pan American Airways) e, mais tarde, passou a ser controlada por acionistas brasileiros. Desde os anos 30, a história da Panair do Brasil se confunde com a modernização do país e a integração nacional, aproximando cidades da distante Amazônia, do Nordeste e do Centro-Oeste com o eixo Rio-São Paulo, o Sudeste, e o Sul do país. Nas asas da Panair, a bandeira brasileira também chegava a outros países da América do Sul, à Europa, à África, aos Estados Unidos e ao Oriente Médio.

Durante a Segunda Guerra Mundial (1939-45), a companhia também participou do esforço do Brasil de defesa do Atlântico Sul. Na década seguinte, teve a honra de transportar os craques da seleção, entre eles Pelé e Garrincha, que conquistaram a tão sonhada Copa do Mundo, em 1958, na Suécia. No seu auge, na era dos modernos Constellation, dos Caravelle e dos jatos DC-8, ficou famoso o chamado “Padrão Panair”, visto como excelência em aviação, incluindo o atendimento a passageiros com talheres de prata e copos de cristais. Nos seus 35 anos de operação, a empresa também foi marcada por tragédias. Dezenas de passageiros morreram em acidentes aéreos, ocorridos no Rio, em São Paulo, Porto Alegre, Recife, Salvador e Manaus, entre outras cidades.

A companhia aérea foi ainda celebrada em canções, como a interpretada por Elis Regina em “Conversando no Bar” (Saudade dos Aviões da Panair), sucesso de Milton Nascimento e Fernando Brant (“A primeira Coca-Cola, foi, me lembro bem agora, nas asas da Panair…”). A voadora também serviu de inspiração para o poema “Leilão do ar”, de Carlos Drummond de Andrade. Recentemente, a sua memória foi revivida no cinema com o documentário “Panair: uma história de amor com o Brasil”, do diretor e produtor Marco Altberg, acalentado durante 11 anos com a sua mulher, Maíza Figueira de Mello. Ela é neta de Celso da Rocha Miranda, o maior acionistas da companhia quanda foi fechada na ditadura e um dos seus três principais executivos, ao lado de Mario Wallace Simonsen e Paulo Sampaio.

O filme, de 2008, resgatou o otimismo dos anos 50 e início dos 60, quando o país voava “nas asas da Panair”. Para Altberg, a perseguição à Panair ocorreu pela ligação de seus executivos com notórios opositores da ditadura. Rocha Miranda era ligado ao ex-presidente Juscelino Kubitschek, enquanto Simonsen mantinha ligações com João Goulart, deposto da Presidência pelos militares em 1964. O diretor disse que os militares achavam que os dois poderiam ser um suporte financeiro para a volta de JK e Jango.

FONTE: O Globo

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Jorge Alberto

Pequena “correção”: Não houve “ditadura”, mas sim Estado de Exceção….

edurval

Jorge Alberto 11 de fevereiro de 2015 at 12:53 #

Vixi!!! Vamos mudar o rumo dessa prosa, pois já estamos cansados de discutir esse assunto.

De talheres de prata e cálices de cristal para barras energéticas.

Onde foi que nos erramos? 🙂

Vida longa e prospera a todos

Rafael Oliveira

Hahahaha, boa edurval.

Quanto ao fato em si, só resta lamentar a atitude ilegal e vil da Ditadura Militar contra uma empresa nacional, para favorecer outras empresas concorrentes e prejudicar os consumidores.

Uma pena os responsáveis não terem respondido na Justiça por isso, a tempo e modo. Poderia não ser o suficiente para salvar a PanAir, mas, talvez, o patrono da FAB fosse outro.

Oganza

Foram tempos áureos esses da aviação comercial dos anos 50 e 60… meu Avô me contava histórias fantásticas, os papos que se tinham nas salas de embarque… a elegância com que as pessoas se preparavam para o evento, pois era um evento… rsrsrs Ele me contava do bom humor e da inteligência dos tripulantes e da beleza das aeromoças, que eram incrivelmente inteligentes e perspicazes… esse meu Avô… hááá se Vovó soubesse… kkkkk Ele me contava: Em minha primeira viagem pelo Banco do Brasil a NY, estava todo empolgado e não queria parecer meio bobo, então, o voo da Panair… Read more »

Nelson Guimaraes

O Brasil voou nas asas da Panair !

Oganza

Respondido na Justiça? O caso nunca foi por completo encerrado e ainda está aguardando uma decisão para a indenização dos familiares. Existe uma edição da revista ASAS muito completa, com mais de 30 páginas de dedicada a saga da Panair e como a companhia contribuiu, praticamente foi a responsável, para a criação das rotas aéreas no território brasileiro. A matéria conta tb a separação que se acentuava cada vez mais da Matriz Americana, com a Panair do Brasil começando a lucrar mais que sua irmã do norte e decidindo como e quando montar sua frota e com que tipos de… Read more »

Rafael Oliveira

Oganza,

Já até imaginei a figura que era seu avô rsrsrs.

Sobre responder na Justiça me referia à conduta dos agentes políticos (Eduardo Gomes, Castelo Branco, etc) envolvidos e não apenas da União (que é quem irá pagar o pato). Seria caso para um “Sérgio Moro” resolver.

Aliás, sobre a nossa querida Justiça, esse “tempo razoável para a solução do processo” é típico para esse tipo de caso. O processo de indenização relativo à desapropriação e nacionalização da Vale também não acabou ainda.

Abraço!

Kojak

Da minha época: Cruzeiro do Sul, VASP, Transbrasil todas com 727-100/200, aquela escada no final da fuselagem era um charme. Avião gostoso de se voar como pax. Voei no primeiro A 300 VASP Electra’s da Ponte Aérea 737 todos, 100 ao 800 F 27 e F 50 TAM F 100 – Muito bom ATR 42 – Todos Bae 146 Brasília Bandeirantes A 310 até A 340 DC 8, 10, MD 11 e MD 88 DC 3 e mais um monte de aero, Tenho frustração de não ter conhecido a Panair, meu pai me contava histórias muito legais. A Irmã dele,… Read more »

F15_lobo

Meu pai trabalhou na Panair até o último dia. O problema foi que um presidente idiota quiz transferir a capital do país lá para o fim de mundo, não tinha estrada para lá não existia nada. Vcs acham que cimento, engenheiro, trabalhador isso ia como para lá??? Avião da Panair a Varig não fazia voo para lá. Junte o que está escrito na matéria e isso = falência da Panair e por aí vai

eparro

Kojak 11 de fevereiro de 2015 at 16:59 #

Pô Kojak: Electra, Transbrasil (ainda bem que não disse Sadia); meu faz tempo heim?

Bom Kojak, parece que já define tudo, né?

Saudações!

Mauricio R.

OFF TOPIC…

…mas nem tanto!!!

Para quem quiser saber mais, como o regime militar estrepou a Panair:

“Pouso forçado”, Daniel Leb Sasaki, Ed. Record.

“Transbrasil (ainda bem que não disse Sadia)”

Eu voei de Dart Herald.

Kojak

“eparro 11 de fevereiro de 2015 at 21:10 # Kojak 11 de fevereiro de 2015 at 16:59 # Pô Kojak: Electra, Transbrasil (ainda bem que não disse Sadia); meu faz tempo heim? Bom Kojak, parece que já define tudo, né?” Esqueci da Inter Star Brasil, subsidiaria da Transbrasil, TABA, Pantanal, Passaredo de A 310, etc ….. Sadia também, era um bi-turbina no final da fuselagem, barulhento ………. Britânico Ba não sei o quê. kkkk “Mauricio R. 11 de fevereiro de 2015 at 23:41 # “Transbrasil (ainda bem que não disse Sadia)” Eu voei de Dart Herald.” Dart Herald ? Ganhou… Read more »

Kojak

Achei, Sadia ia de One-Eleven,

esqueci:

767-200/300ER – Transbrasil

707 – Varig – LAP

747-200/300/400 – Varig – KLM

Sds

Kojak

“Roberto F Santana
12 de fevereiro de 2015 at 9:21 #”

Caro Roberto

é esse mesmo, horrível.

Cito que comecei de garoto com meu finado Pai, sempre como pax.

Isso sempre se deu mais por trabalho, mas várias vezes a passeios ou misto.

Faz um ano e seis meses que não voo, motivos de saúde, estou proibido temporariamente.

Com essa perdi:

Chile, Itália, España, Alemanha, Turquia e China.

Mas vivi, foi uma boa troca …… mas que eu estou pu ……. estou (kkkk).

Abraços.

Rafael Oliveira

Bom, quando eu comecei a voar, nem a Vasp existia mais rsrs.

Mas, vendo o Constellation da Panair no Museu Asas de um Sonho me deu uma vontade tremenda de voar nele.

E no Jahú também rsrs.

Abraços!

Brandenburg

Esqueceram da Real Aerovias e seus DC-3 e ainda voei muito na Amazonia em C-47 com banco longitudinal da FAB. Comandava um pelotão de fronteira e pegávamos carona nos chamados “voos da misericórdia”.Uma aventura. Puro saudosismo! Sds.

eparro

Mauricio R. 11 de fevereiro de 2015 at 23:41 #

Kojak 12 de fevereiro de 2015 at 9:09 #

Meus, se começarmos a somar a quantidade de “nossas primaveras” dá três dígitos de cara!

Aliás, um encontro seria ótimo mesmo!

Kojak

“Roberto F Santana 12 de fevereiro de 2015 at 10:00 # Roberto F Santana 12 de fevereiro de 2015 at 10:27 # P.S. Tem um que eu voei e você não: o 757 …. provavelmente deva ter voado foram o Vickers Viscount e o YS-11.” Verdade Caro Roberto 757 não, só vi em aeroporto. Quanto aos outros dois eu vi muito do terraço do aeroporto de Congonhas, era meu principal passeio de Domingo. ia na DKW Vemaguet do meu pai, depois numa Kombi “bananinha”, depois numa Rural ….. ops o assunto é avião (rs). “Mas diga aí ‘cumpanhero’, você não… Read more »

Kojak

“Brandenburg 12 de fevereiro de 2015 at 10:57 #” Essa eu não peguei Caro Colega, mas tem história heim …. não me lembro nem deles no pátio, acho que eu estava nas fraldas ainda, mas Papai falava muito da Real. “eparro 12 de fevereiro de 2015 at 10:57 # Meus, se começarmos a somar a quantidade de “nossas primaveras” dá três dígitos de cara!” Eu e o Brandenburg já estouramos mole mole (rs), nesse encontro que eu proponho será séculos, todos sem exceção nos encontraríamos para comer as ovelhas do JM, as passagens aéreas saindo de infinitos lugares seriam da… Read more »

Oganza

Kojak,

hahahaha… fantástico… infelizmente não garanto minha presença, teria que ter um lastro ai de uns 3 meses do evento para eu colocar na maldita agenda… 🙁

Mas vai que!!! Organizem… nunca se sabe… 😀

Grande Abraço.

Brandenburg

Kojak
” Eu e brandenburg estouramos mole mole….” Com certeza caro companheiro. 65 bem vividos!Sds

Delfim

Aí o PT no poder acabou com a VARIG.

Será que quando o PT sair vão acabar com a TAM ?

Kojak

“Oganza
12 de fevereiro de 2015 at 15:11 #”

O evento tem que ter uma ótima preparação e programação, tu sabes que dá trabalho.

Minha sugestão, preparamos ao longo de seis a 10 meses com data definida. Ai creio que rola melhor.

“Brandenburg
12 de fevereiro de 2015 at 15:12 #”

120, kkkk

Caso consigamos montar esse evento tem que ter um super book digital com uma história/estória de cada presente.

Abraços fraternos

Celestiano

Infelizmente, uma história perdida no (e em pouco) tempo.
“Por que nunca antes na história desse país…”

Uma sugestão aos de muitas luas.
Escrevam suas memórias, e deixem legado fantástico aos seus descendentes, e a outros que se interessarem.

felipe

Na Venezuela, a ditadura tem acabado com várias empresas, especialmente emissoras que não apoiam o regime.

Delfim

Uma coisa que sempre me chamou a atenção é: por quê as grandes empresas brasileiras de linhas aéreas, que representam o Brasil no exterior, não utilizam o nome… Brasil ?

Dell72
Kojak
CH

A ditadura militar matou a PanAir e criou uma gigante, a Varig. Destruiu a Tupi, criou a Globo…

Rafael M. F.

O Lockheed Electra tinha um ronco inconfundível. Ele passava por cima do meu bairro quando em aproximação final para pousar no Galeão.

Luiz Trindade

Pra tu ver né? A Varig tomou de forma duvidosa para o dize o mínimo a concessão da Panair e anos depois se lascou e foi vendida a preço de banana para Gol Linhas Aéreas pelos mesmos cassados e perseguidos da ditadura militar.

A justiça de Deus pode tardar, mas jamais falha!

A. CELSO VASCONCELLOS

Sou investidor e como tal sei de uma verdade inquestionável… Toda companhia aérea irá a falência… o problema é saber quando. É só olhar para o passado. Só no Brasil… Panair, Real, Loyd Aéreo, NAB, Transbrasil, Vasp, Varig e, recentemente Avianca. Não adianta. É uma atividade muito cara e de pouco lucro. E esse lucro vem , exclusivamente das classes executiva e primeira, que apesar de poucos assentos, nem sempre lota. Jamais comprei e jamais comprarei ação de uma aérea. Nos U.S. o caso mais emblemático foi o da Pan Am, a maior e mais poderosa aérea do mundo… que… Read more »