Possível novo tampão da FAB poderá vir de unidades da USAF em atividade, reforçando a alegação de serem caças do modelo Block 40/42

No final do mês de agosto o Poder Aéreo publicou uma matéria, baseada em fontes dentro da Força Aérea Brasileira (FAB), sobre uma viagem de militares da FAB aos Estados Unidos para avaliar o estado de caças F-16 estocados, que eventualmente funcionariam como um novo “caça-tampão”. O objetivo seria cobrir a desativação dos jatos Mirage 2000 e compensar a contínua indecisão do Governo por um vencedor do programa F-X2, o que tem adiado cada vez mais a perspectiva de entrada em operação de um caça definitivo. Essa viagem, segundo outras fontes a que tivemos acesso, teria sido antecedida por voos de testes realizados por um piloto (ou pilotos) da FAB em aeronave semelhante, em esquadrão da USAF (Força Aérea dos EUA). Informação semelhante sobre o interesse de caças F-16 pelo Brasil também foi divulgada recentemente pela edição 234 da revista Aeromagazine, publicada neste mês de novembro.

No entanto, tanto a matéria do Poder Aéreo quanto a reportagem publicada na revista Aeromagazine citam o interesse da FAB por caças F-16 do modelo Block 40/42. Segundo levantamento feito aqui no Poder Aéreo, não existem caças Block 40/42 estocados no 309th Aerospace Maintenance and Regeneration Group (AMARG), localizado na Base Aérea de Davis-Monthan, próximo de Tucson, Arizona.

Porém, novas informações obtidas pelo Poder Aéreo dão conta de que estes caças poderiam vir não do deserto do Arizona, mas sim de esquadrões em atividade. Neste caso, a hipótese de serem Block 40/42 ganha força.

‘Sequestration’

A USAF, assim como as demais Forças Armadas dos EUA, está passando por um processo de enxugamento e drástica contenção de despesas em função dos cortes orçamentários que ocorrerão nos próximos dez anos (processo também conhecido como “sequestration”). Existem programas militares em desenvolvimento que, por questões técnicas ou  políticas, não serão afetados ou eventualmente pouco afetados, mas que precisam ter seus recursos garantidos. E de onde vêm esses recursos? Da contenção de despesas.

Para manter o fluxo de recursos para estes programas, assim como o equilíbrio orçamentário, a USAF está avaliando cortar unidades em atividade. Dentre as diversas opções existentes (nenhuma delas fácil, diga-se de passagem) existe a possibilidade de aposentar todos os bombardeiros B-1B e/ou todos os aviões de ataque A-10.  Também existe a possibilidade de reduzir a quantidade de esquadrões de caças F-15 e F-16. Tudo isso ainda está sendo avaliado.

Este processo de enxugamento da USAF suporta a hipótese de que alguns caças F-16 Block 40/42 poderiam ser enviados para o AMARG em breve (assim como mais outros de versões anteriores). No entanto, esses jatos poderiam continuar sua vida operacional em outras forças aéreas antes do descanso definitivo no deserto.

caças F-16 na Base Aérea de Hill nos EUA afetados pela Sequestration - foto USAF

Se a eventual transferência de caças já estocados no deserto para a FAB parecia remota em função da urgência da situação (as aeronaves estocadas, de versões mais antigas, deveriam passar por um processo de recuperação antes de serem colocadas em atividade, consumindo um tempo precioso que a aviação de caça da FAB não possui), a transferência de caças F-16 lotados nos esquadrões da ativa da USAF, diretamente para a FAB, representaria um solução de curto prazo. Isso dispensaria modernizações, bastando “apenas” as formalidades da negociação dos  jatos, sobressalentes, treinamento e adaptação dos pilotos e das equipes de manutenção ao “novo” aparelho.

Mas é preciso lembrar que a “solução F-16” resolveria apenas uma situação emergencial vivida pelo País neste momento. Uma solução definitiva ainda aguarda uma definição, há anos postergada pelo Governo e que, pelos acontecimentos recentes, não parece estar próxima do momento de decisão. Em setembro deste ano, conforme revelado pelo Poder Aéreo, as propostas dos três finalistas do programa F-X2 precisaram ser revalidadas por mais seis meses, valendo até março do ano que vem, que por sua vez é um ano eleitoral. Ao mesmo tempo, o caça que era tido recentemente como favorito deixou de sê-lo.

Espionagem

Com é de conhecimento amplo, houve um desgaste nas relações entre o Brasil e os Estados Unidos recentemente, em função da divulgação de que a agência de espionagem norte-americana NSA teria acessado mensagens eletrônicas da cúpula política brasileira, incluindo a própria presidente Dilma, assim como a interceptação de conversas telefônicas.

Uma das consequências deste episódio foi o cancelamento (inicialmente anunciado como adiamento) da visita de Estado que a presidente Dilma faria à Casa Branca em outubro deste ano. Porém, alguns setores da imprensa nacional davam como certa o anúncio da escolha do caça F/A-18E Super Hornet da Boeing como vencedor do programa F-X2 durante a visita. O governo brasileiro nunca se manifestou oficialmente sobre este eventual anúncio, mas o que realmente aconteceu foi mais um adiamento da decisão do F-X2.

Por parte dos Estados Unidos, o que poderia estar por trás de uma eventual disponibilização de caças F-16 Block 40/42 à FAB seria a possibilidade de Washington se reaproximar do Governo do Brasil, amenizando as consequências desgastantes do episódio onde ambos os países saíram perdendo.

Também não é do interesse de Washington que a capacidade de defesa aérea do Brasil seja duramente degradada, principalmente nos próximos anos, quando ocorrerão eventos esportivos de caráter internacional no País, e que demandam proteção aérea de credibilidade. Apesar da Copa do Mundo ser daqui a pouco mais de seis meses, praticamente descartando a entrada em operação efetiva de um “caça tampão”, deve-se ressaltar que no grande evento seguinte, os Jogos Olímpicos de 2016, o Brasil receberá  diversas delegações estrangeiras. E uma das maiores delegações será justamente a dos Estados Unidos.

F-16 de unidade da Carolina do Sul decola de Nellis - foto USAF

Vertentes

Ainda segundo fontes do Poder Aéreo, essa questão dos caças atualmente divide a FAB (e, em parte, setores do Governo) em três vertentes. Existe um grupo dentro da FAB que trabalha incansavelmente para que o programa F-X2 seja definido o mais breve possível, para que os prejuízos da defesa aérea sejam mínimos. Este grupo atua constantemente junto à esfera política do País, buscando convencer as autoridades da importância do programa e dos prejuízos crescentes advindos da não decisão.

Paralelamente, um outro grupo atua nos bastidores, bem longe dos holofotes, com o propósito de definir um novo tampão para a FAB, como solução emergencial. Esta hipótese vem ganhando força com o passar do tempo, uma vez que o adiamento da decisão do F-X2 coloca em cheque todo o planejamento da FAB, reduzindo também a capacidade de dissuasão do País. Os caças Mirage 2000 sairão de cena no final do ano e os primeiros F-5 modernizados deverão dar baixa em 2017, conforme já foi dito por altos oficiais da FAB. Para essa vertente, está claro que um hiato ainda mais grave do que a baixa dos jatos Mirage 2000 ocorrerá na Aviação de Caça, em breve, se um tampão não for adquirido no curto prazo.

Há também um terceiro grupo, composto por elementos do Governo e que ganhou adeptos na FAB, que defende o cancelamento do programa F-X2 e a compra de caças russos (muito provavelmente da família Flanker, e de forma combinada a uma parceria futura e de longo prazo no programa do Sukhoi T-50, de quinta geraçÃo). Foi dito que essa proposta, feita no mês passado por uma delegação que visitou o Brasil, “balançou” alguns setores dentro e fora da FAB.

KC-X2, outra pendência

A FAB teve a oportunidade de entrar para o mundo do reabastecimento aéreo (REVO) com a compra dos F-5E, em meados da década de 1970, seguida primeiramente da aquisição de quadrimotores turboélice KC-130H, com capacidade de reabastecer os novos caças no ar, e depois de quadrimotores a jato KC-137. Desde então, a FAB conhece bem as vantagens táticas e estratégicas desta operação e não quer perder a expertise adquirida ao longo de tantos anos.

No entanto, com a desativação das últimas aeronaves KC-137 do esquadrão “Corsário” no dia 10 de outubro, a Força Aérea conta atualmente com um único KC-130H disponível para missões REVO. Na verdade, durante a Operação CRUZEX 2013, a FAB teve que se apoiar nas aeronaves de reabastecimento da Colômbia e da USAF devido à diminuição drástica de seus próprios aviões reabastecedores, mostrando a atual deficiência da força nesta área específica. Em breve, deverá voar o novo KC-390, jato de transporte da Embraer com capacidade de reabastecer os caças da FAB em voo. Porém, até a entrada efetiva em operação e em quantidade suficiente, naturalmente vão se passar longos anos.

O problema poderia ser totalmente contornado se o governo aprovasse a compra de dois jatos 767 (com possibilidade de um terceiro) que seriam convertidos pela empresa israelense IAI. Esta proposta foi a vencedora do programa KC-X2, gerenciado pela COPAC, conforme anunciado oito meses atrás.

KC-135 na CRUZEX 2013 - foto Icaro

No entanto, algumas fontes do Poder Aéreo (assim como de outras publicações) informaram que a proposta da IAI está “engavetada” porque o governo negocia, em segredo, a compra de um avião presidencial de longo alcance de segunda mão, atrelado à aquisição de aviões reabastecedores, de forma totalmente dissociada da seleção do KC-X2.

Porém, essa eventual compra poderia ser “atropelada” por outra proposta tentadora, de baixo custo e que proveria solução quase imediata. Fontes do Poder Aéreo informaram que a USAF estaria disposta a transferir três KC-135 Stratotanker para a FAB já no ano que vem. E essa negociação (sempre lembrando que são informações das fontes do Poder Aéreo, ligadas a possibilidades em estudo, e não uma verdade absoluta a se confirmar) independe de qualquer acordo sobre a compra de caças F-16 usados.

Nada ainda está muito claro (nem sobre os caças e nem sobre os aviões de reabastecimento) e existem alguns desencontros em relação a informações fornecidas pelas fontes, quando comparadas entre si. No entanto, o que parece muito claro é que o Governo está pouco interessado nas avaliações técnicas feitas pela FAB, querendo decidir por conta própria como a Força Aérea Brasileira deve ser mobiliada, ou simplesmente não querendo decidir nada.

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