Leilão de aeroportos: o fácil não deveria ser o certo?
Vinicius Carrasco e João Manoel Pinho de Mello
O atual estado dos aeroportos brasileiros é incompatível com as necessidades de um país cuja demanda por transporte aéreo tem aumentado substancialmente ao longo dos últimos anos, e que sediará eventos importantes nos próximos anos. A concessão do direito de exploração de aeroportos a empresas especializadas (ou ao menos mais especializadas na exploração de aeroportos que o governo) gerará ganhos de eficiência e gestão, o que certamente beneficiará os usuários e o Tesouro, que poderá se apropriar de parte dos ganhos de gestão a serem introduzidos por meio da receita obtida com a privatização. Portanto, é salutar a iniciativa do governo de privatizar os aeroportos de Guarulhos, Brasília e Campinas.
Os ganhos a serem proporcionados aos usuários e ao Tesouro com a privatização dependem, entre outros fatores, do mecanismo de venda utilizado pelo governo. Na última semana, foi feito o anúncio das regras do leilão que determinarão a concessão dos aeroportos.
Um dos responsáveis afirmou que será “um dos leilões mais complexos” já realizados no país. Isso parece contradizer um princípio básico sugerido pelos maiores especialistas no mundo em desenho de regras de leilões: um bom desenho deve fazer com que seja fácil para os participantes obter bons resultados no leilão. Isso induzirá maior participação e competição e fará com que os participantes se sintam seguros para fazer lances que reflitam sua percepção do valor do objeto leiloado. Regras que, por exemplo, demandem que seus participantes consigam prever de maneira precisa o comportamento dos oponentes tendem a ter maus resultados práticos.
Brasil parece querer arranjos genuinamente nacionais quando se pensa em desenhar mercados
Pode-se arguir que complexidade per se não é algo muito importante, uma vez que os participantes de um leilão como esse são bastante sofisticados e entenderão perfeitamente suas regras. Mais: como nos ensinou Neném Prancha, “o importante é o principal, o resto é secundário” e que, embora complexas, as regras propostas fazem muito bem ao principal.
O “principal” a ser alcançado em um leilão envolve dois componentes: 1) eficiência, pois o leilão deve alocar os aeroportos às empresas mais aptas a gerí-los e que implantarão de maneira mais eficaz as melhorias necessárias, o que gerará benefícios aos usuários; 2) receita, pois o leilão deve induzir que as empresas façam lances altos, o que resultará em maiores recursos para o Tesouro. Nossa impressão é que o “principal” vai mal no desenho proposto. Vejamos dois exemplos.
No primeiro estágio do leilão proposto, os participantes deverão fazer lances em envelopes fechados para os aeroportos que sejam de seu interesse. Nesse estágio, as regras do leilão estabelecem que, se um determinado aeroporto receber o lance de um único participante, esse aeroporto será vendido ao participante em questão, que terá as ofertas feitas para outros aeroportos descartadas (a razão para que nenhum participante leve mais que um aeroporto não está clara, uma vez que a possibilidade de exercício de poder de mercado nos parece bastante limitada; mas vá lá).
Agora, suponha que, antes de saberem os preços finais, os participantes considerem que o aeroporto A seja o mais rentável e que B seja o aeroporto cujos resultados futuros sejam os mais arriscados e menos promissores. Caso façam lances por B no primeiro estágio, os participantes correm o risco de terem as ofertas para A desconsideradas.
Obviamente, os participantes ficarão um tanto reticentes em fazer lances por B. Como consequência, numa situação na qual prever o comportamento dos oponentes seja difícil, há uma chance de não haver lances por B, o que fará com que o resultado final seja ineficiente (seria melhor alocar o aeroporto B a algum participante). Caso haja lances por B no primeiro estágio, é provável que eles sejam baixos, uma vez que os participantes demandarão um “prêmio” para compensá-los pelo risco de terem suas ofertas por A descartadas. Lances iniciais baixos certamente não contribuem para a receita final do leilão.
Um segundo exemplo de mau desenho é a regra que seleciona os vencedores baseada no “Maior Valor Global de Contribuição”. Entre outras coisas, essa regra pode fazer com que um participante que tenha feito a segunda menor oferta por um aeroporto acabe como vencedor.
Em geral, tudo o mais constante, participantes mais aptos a gerir um ativo estão dispostos a fazer lances mais altos por esses ativos. A regra, portanto, faz com que um aeroporto possa vir a ser gerenciado por um participante que não é o mais apto, o que introduz uma ineficiência (e resultante redução nos benefícios a usuários). Um incauto poderá argumentar que a contrapartida à redução de eficiência é um aumento de receita, uma vez que vencedores serão escolhidos de maneira com que a “contribuição global” seja máxima. O argumento ignora o fato que os participantes deverão responder a essa regra fazendo lances menos agressivos (ou, como diria outro gênio do futebol, para que a tática funcione, é preciso combinar com os russos). Os efeitos sobre receita podem ser bastante deletérios.
A avaliação a posteriori do desempenho do efeito de regras sobre o desempenho de um determinado leilão é bastante difícil, pois envolve uma análise contra-factual (quais teriam sido os resultados sob outras regras). No entanto, os problemas acima apontados não existiriam se as regras do leilão fossem, por exemplo, mais próximas das de um “Leilão Simultâneo Ascendente”, como o utilizado com bastante sucesso nos leilões de espectro da FCC americana e aplicado em várias instâncias ao redor do mundo. Nesse leilão, os participantes podem obter bons resultados com estratégias bastante simples. Mais: o leilão induz eficiência e boa receita ao leiloeiro.
Outros desenhos, com boas propriedades teóricas e já testadas na prática, também são possíveis. No entanto, assim como na política macroeconômica, parecemos querer arranjos genuinamente nacionais quando pensamos em desenhar mercados. Policarpo Quaresma estaria muito orgulhoso das contrapartes econômicas do nosso Tupi.
Vinicius Carrasco e João Manoel Pinho de Mello são Ph.Ds em economia pela Stanford University e professores do Departamento de Economia da PUC-Rio.
FONTE: Valor Econômico
O problema é que o usuário, no caso Eu, no caso, todos nós, de reféns do Estado viramos reféns de empresas, como é hoje nas estradas pedagiada$…e aí o empresariado vem com a mesma retórica de sempre, de que o custo brasil é isso, é aquilo…e o governo cria mais uma agência reguladora que não regula nada e só serve de cabide de emprego para os afilhados políticos e pagar campanha eleitoral…ou alguém vai me dizer que a Anatel ou ANTT servem para alguma coisa? Ah, servem sim, para dizer “sim senhor” para os empresários…
Caro Giordani, Permita-me discordar de tudo o que você escreveu. Pra começar que praticamente tudo o que foi privatizado no Brasil melhorou, e melhorou muito!!! Telefonia, Vale, Embraer, Empresas de Energia…são apenas exemplos. Se hoje elas ainda não são perfeitas, são pelo menos infinitamente melhores do que foram no passado. E eu não me sito refém de nada. Já processei e ganhei da Oi (telefonia), da TAM, LAMSA (que controla rodovias no Rio). Errou comigo vai pro pau e perde! O mesmo se aplicará a essas empresas que tomarão conta dos aeroportos. Agência Reguladora ainda é uma instituição fraca no… Read more »
Privatiza TUDO! Já! E abaixo a Infraero, a pior, mais nefasta e mais aparelhada empresa do planeta! A Infraero deveria ser EXTINTA!
Isso posto, não tenho dúvidas que o leilão dos aeroportos vai dar chabú. O governo do PT não tem nem culhões nem competência pra privatizar direito.
Isso porque o ParTido ainda não se decidiu a abraçar o capitalismo, mas sim o seu modelo peculiar de “capitalismo de Estado” ou “comunismo de capital”.
Papo furado de que empresa estatal é do ” Povo “! Andem nos escritórios da Petrobrás e da Vale e verão um monte de ” companheiro ” iletrado, usando terno e gravata, sentado numa mesa e jogando ” paciência “. Vá as empresas públicas do Ministério das Minas e Energia e verá que até o cachorro da emprega do cara do Maranhão está na folha de pagamento. Bem: tem que privatizar tudo e abrir concorrência no mercado. ” Estado ” tem que cuidadar da educação, segurança e saúde. O resto, serve só para ” mamar “.