Táticas de guerra sofrem mudanças no céu do Afeganistão
Uso do poder aéreo mudou durante o longo conflito, refletindo os custos políticos e a sensibilização com vítimas civis
Por C. J. Chivers
O comandante Layne McDowell olhou por cima de seu ombro esquerdo, de dentro da cabine de um caça F/A-18 da Marinha, observando um cânion na província de Kandahar, no Afeganistão, que ficava 2,8 mil metros abaixo. Uma companhia da infantaria dos Estados Unidos encontrava-se no local.
Os soldados foram deixados lá por helicópteros. Agora, um controlador de solo queria que os três caças de ataque que circulavam a zona aérea da região enviassem um sinal para possíveis insurgentes do Taleban que estivessem abaixo.
McDowell alinhou o bico de seu caça à extremidade nordeste do cânion. Então, ele seguiu o exemplo de seu parceiro e mergulhou para uma altura de 1,5 mil metros atingindo uma velocidade de 997 km/h, e quando estava mais perto das tropas, deu sinal de sua proximidade com um ronco do motor.
Na linguagem do apoio aéreo, sua manobra foi considerada uma “demonstração de presença” – uma exibição em baixa altitude e não-letal destinada a tranquilizar as tropas terrestres e também a sinalizar ao Taleban que os soldados não estão sozinhos. Essa manobra também reflete uma mudança na maneira como os Estados Unidos utilizam sua força aérea, tirando o foco do uso de uma violência avassaladora a favor de manobras que muitas vezes não exigem confronto.
O uso do poder aéreo mudou acentuadamente durante o longo conflito no Afeganistão, refletindo os custos políticos e a sensibilização com vítimas civis de ataques indiscriminados ou errantes, e o aumento do uso de ataques de aviões não tripulados, que podem vigiar potenciais alvos por longos períodos de tempo sem risco para pilotos ou aviões mais caros.
Caças tripulados por pilotos, no entanto, continuam a ser um componente essencial da guerra, em parte porque pouco no arsenal dos aliados ele é considerado tão versátil ou imponente, mas também por causa de melhorias feitas nos sensores das aeronaves.
A carreira de McDowell acompanhou essas mudanças. No início da guerra, em 2001, aviões americanos muitas vezes atacavam da melhor maneira para maximizar a violência, incluindo bombardeios e ataques com munições teleguiadas.
Decolando em um esquadrão de F-14s do porta-aviões USS Enterprise, McDowell usou quase 27 mil quilos de munições na primeira semana da guerra, destruindo aeronaves e veículos Taleban em Herat e atacando campos de treinamento e quartéis na província de Kandahar.
Ele já tinha voado dois anos em Kosovo e no Iraque, onde em 32 missões de combate usou quase 15 mil quilos de munições teleguiadas, inclusive contra quartéis generais que foram atingidos quando havia um grande número de soldados no local.
“Nossa cultura é muito focada apenas em matar”, disse. “É assim que nós treinamos, e naquela época a mentalidade era: conseguir maior matar o maior número de inimigos, ter o maior número de bombas no convés, para conseguir um maior efeito psicológico.”
Isso foi antes. Quase uma década depois, sua missão mais comum é o que chama de “sobrevoar”, ou escanear digitalmente o terreno através em busca de sensores infravermelhos e informar as tropas em terra pelo rádio sobre o que vê lá de cima.
Em 953 missões aéreas de apoio realizadas pelos 44 caças F/A-18 Super Hornets a bordo do porta-aviões USS John C. Stennis, de onde McDowell agora faz suas decolagens, as aeronaves bombardearam alvos apenas 17 vezes. Por outro lado, elas realizaram voos baixos ou de média-elevação mais de 115 vezes.
As mudanças nas missões e táticas, em parte, refletem as adaptações feitas pelo Taleban. Mas guiadas por regras complexas de combate e por uma doutrina de proporcionalidade e moderação, também refletem o que McDowell chama de “uma mentalidade diferente”.
Hoje em dia, o esforço para ter uma seleção de alvos mais precisa e minimizar as vítimas civis tornou-se uma prática padrão. Projetar seu poder sem necessariamente ter que atacar também é uma prática rotineira. Lançar bombas não é.
“Tanta coisa mudou desde quando eu estive aqui pela primeira vez”, disse, olhando para o Afeganistão em um voo de seis horas no início da semana passada. “Se for possível completar a missão de outra maneira, eu prefiro fazer isso do que ter que bombardear”.
Durante uma hora, um dos jatos usou seus sensores infravermelhos para observar edifícios e o cânion, acompanhando o movimento dos soldados. Os Talebans não apareceram.
Uma nova mentalidade
Após terem reabastecido pela segunda vez, os jatos entraram em contato com um controlador de solo perto do rio Arghandab, região que no final de 2010 fazia parte de uma ofensiva de ataques para desalojar o Taleban.
Antes dessa estratégia ofensiva, a presença americana ao longo do rio era pouca. Agora, do ar, o mapeamento da região se tornou mais fácil. O rio tinha uma rede de postos e bases com altos muros, muitos deles vigiado por câmaras instaladas em dirigíveis parecidos com balões.
Se existe um local que pudesse demonstrar a maneira com a qual o papel de McDowell no campo de batalha mudou ao longo de sua carreira, este era ele mesmo. McDowell fez uma curva lenta à esquerda, apontando para uma área onde, vários dias antes, uma patrulha de infantaria havia se deparado com atiradores afegãos.
Os homens armados tinham disparado de um campo não muito longe da Base Avançada Wilson e depois se escondido em um conjunto de edifícios de paredes de barro. McDowell chegou ao local em minutos. O que aconteceu depois demonstrou o contraste entre as velhas práticas e as novas.
A infantaria o direcionou até o prédio. Em seguida, eles marcaram o local atirando uma granada de fumaça em suas paredes. Acima, McDowell fixou seu sensor infravermelho no complexo, compartilhando sua visão por vídeo com um controlador de solo, que confirmou que ele estava olhando para o lugar certo. O que fazer?
Em 1999, no final da guerra em Kosovo, McDowell disse que nessa situação os pilotos teriam simplesmente matado os insurgentes.
Quase uma década depois, ele sobrevoava uma casa onde pelo menos dois combatentes do Taleban tinham se abrigado após terem aberto fogo contra um pelotão dos Estados Unidos. Mas ele não sabia quem mais poderia estar lá dentro. Nem ele nem os soldados solicitaram uma autorização para um ataque aéreo.
“E se nós bombardeássemos a casa e matássemos os dois indivíduos armados lá dentro, mas também oito crianças?” questionou.
Voando alto sobre o rio Arghandab, ele apenas deu uma olhada para a casa que as novas regras tinham poupado.
Indicando o painel de mira dentro da cabine, ele mostrou a proximidade daquela casa com outras casas e descreveu os limites do que reconhecia como “padrões de vida” – ou, o ritmo da atividade humana no local onde os combatentes Talebans se esconderam.
“Eu não pensava à respeito dessas coisas na guerra do Kosovo”, disse ele.
FONTE: New York Times / iG
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Perceber que o final ficou em aberto… ele pensou a respeito, mas bombardeou ou não a casa? Hum…
Quanto aos custos políticos e a sensibilização com vítimas civis, uma guerra é travada para se ganhar. Se esses custos são maiores que os benefícios, não entre em guerra. Simples. Isso tá ficando pior que o Vietnam…
Isso aí é só a cereja do bolo. Uma historia de bom moço, que no futuro poderá se tornar mais um campeão de bilheteria. Da lança que foi cravada no peito de algum guerreiro dois mil e quinhentos anos atrás na Mesopotâmia, até a bomba com mira laser que cai na cabeça de algum infeliz no Afeganistão, é sempre guerra; sangue, destruição,estupro,injustiça e tristeza. Melhor que escrever tais frescuras, seria melhor se perguntar, o quê viemos fazer aqui? Ou por que não damos o fora daqui? O General Curtis LeMay, na sua costumeira truculência e arrogância, foi quem melhor resumiu… Read more »
E a forma que o talibã luta que não leva em conta as consequências para seu próprio povo, acabou por mudar a forma de lutar de seus oponentes que acabam preservando mais essass vidas do que eles próprios. E isso de se chegar ao resultado por qualquer meio já deu errado no Vietnã, lembrando do episódio onde coronel Harry Sumers ao indagar um coronel vietnamita de que os EUA não haviam perdido nenhuma batalha no campo de guerra, ouviu desse coronel que isso era irrelevante; pois os EUA haviam perdido o apoio da opinião pública nos EUA e que os… Read more »
Concordo com o Santana e acredito que esses tipos de artigo servem para mudar a opinião publica americana, que só apoio a guerra por causa do 11 de setembro. Não basta vencer o Talibã e a Al Qeada, tem que trazer estabilidade social e politica na região, coias que ninguém, nem os soviéticos conseguiram fazer. Essa frase do general Curtis LeMay se aplica melhor na estrategia dos insurgentes do que das tropas de ocupação. Outro fato é que essa guerra foi benéfica para o governo americano, injetando recursos na sua gigantesca maquina de guerra que estaria enferrujando sem essas duas… Read more »
P/ esse tipo de inimigo, V. não precisa de F-22 / F-35 e por aí. Vai de ST – vide Colômbia – e balão de observação – Ops!, mais “Muderno” – vai de Vant a elástico ou pipa ( o Hermes é muito ). Resumindo cortes de despesas com armas e melhora no atendimento social, mais p/ a saude ( Americanos ortodoxos não gostam muito dessa vertente, pois significa um não para o sistema de meritocracia).
-Vide nosso cenário geopolítico regional e “tamu” quase lá.
Mas muda-se o “inimigo” e tem-se outra realidade, muito mais competitiva.