Por que parcerias aeroespaciais França-Brasil? Porque inovação custa caro
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O painel ‘Novas Parcerias e Transferência de Tecnologia Aeronáutica e Espacial’, do III Fórum de Inovação e Tecnologia França-Brasil, teve a presença de grandes e pequenas empresas, todas com grandes preocupações quanto ao futuro da inovação. Saiba mais sobre o evento em mais uma matéria exclusiva do Poder Aéreo, em três partes.
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O Poder Aéreo, a convite da Thales / Omnisys, esteve presente ao III Fórum de Inovação e Tecnologia França-Brasil, realizado em São Paulo no último dia 8 de novembro. Nossa atenção esteve concentrada no painel “Novas Parcerias e Transferência de Tecnologia Aeronáutica e Espacial”, que contou com a presença de representantes de alguns nomes bem conhecidos do público brasileiro que acompanha as relações de empresas do Brasil e da França na área de defesa: gigantes como EADS, Embraer, Thales e Arianespace. Também fizeram parte nomes nem sempre divulgados, mas de grande importância no setor, como a Hutchinson Aerospace, e os polos franceses de competitividade Pegase, Optitec e ViaMéca, que agrupam diversas empresas de menor porte , mas que trabalham com inovação e tecnologia de forma intensiva.
Nas duas primeiras partes desta matéria, vamos tratar das apresentações e discussões relacionadas aos grandes grupos e empresas (EADS, Embraer, Thales e Arianespace), que fizeram as primeiras exposições, procurando levar o leitor do Poder Aéreo “para dentro” daquele evento. Esta primeira parte foca a EADS e a Embraer, e o título desta matéria, lá em cima, está relacionado ao breve debate entre os representantes das duas empresas, que você vai conferir mais abaixo.
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“Para a EADS, a inovação antes se concentrava num raio de 20km de Toulouse. Hoje a EADS é considerada global e encontra essa inovação no mundo todo.” – Bruno Gallard, presidente da EADS América do Sul
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Gallard abriu a sequência de apresentações do painel, em que fez também o papel de moderador (fazendo comentários e perguntas aos demais representantes entre uma apresentação e outra). A frase acima, sobre a globalização dos interesses da EADS em inovação, faz parte da visão do conglomerado europeu para 2020: ter 20% da sua mão de obra e 40% de seus fornecedores fora da Europa.
Na exposição, a EADS mostrou que não considera mais os EUA e a Europa como detentores do monopólio da inovação e de suas aplicações, notadamente em tecnologia aeronáutica e espacial – o foco do painel. E mais: considera também que essa inovação, hoje, é liderada pelas aplicações civis, e não mais pelas militares.
É por isso que, segundo Gallard, a EADS busca parcerias estruturantes com empresas brasileiras – e não mais apenas a venda de produtos prontos, ou a transferência de tecnologia pontual para produção de alguns componentes locais para encomendas também locais, por subcontratação. As parcerias estruturantes são para compatilhar tecnologia buscando o mercado mundial, e o Brasil teria sido escolhido pela EADS como um dos poucos países do mundo com o qual fazer esse tipo de parceria.
O exemplo prático mostrado foi o programa dos helicópteros EC725, envolvendo a subsidiária Helibras da Eurocopter, que faz parte do grupo, notadamente com a criação do Centro de Engenharia e do Centro de Tecnologia em Helicópteros – o objetivo é desenvolver novos produtos e serviços para o mercado mundial. Especificamente quanto à produção de compontentes-chave do EC725, visando atingir 50% de conteúdo nacional, a apresentação também mencionou contratos assinados com fornecedores instalados no Brasil, como Inbra, Toyomatic, Aernova do Brasil, Rhode & Schwartz, TBMB, Microturbo, Sagem e AEL.
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“A Embraer acumula mais de 42 anos de inovação constante, indispensável para competir nesse mercado intensivo em criatividade” – Fernando Ranieri, diretor de estratégia de engenharia e tecnologia da Embraer
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Num painel onde a presença francesa era claramente majoritária nas apresentações, a Embraer procurou mostrar uma grande quantidade de dados e fatos de seus programas – tanto que extrapolou o tempo disponível (contando com o bom humor do moderador para tanto). A frase sobre os 42 anos de inovação pode ser entendida no contexto da evolução da empresa nessas quatro décadas especialmente no mercado civil, levando hoje a se concentrar em jatos, seja na aviação executiva quanto na regional.
O discurso e boa parte das telas mostravam as vantagens dos jatos em relação aos turboélices, desde os pequenos Phenom aos maiores E-Jets, e como as inovações tecnológicas estavam sendo introduzidas para maximizar essas vantagens ligadas a voos a altitudes e velocidades maiores.
Os jatos executivos Phenom concentraram diversas das inovações apresentadas, por ser uma família de jatos totalmente nova em relação a outros produtos da Embraer, segundo Ranieri. O objetivo foi fazer uma aeronave ao mesmo tempo fácil de pilotar (operada por um só piloto) e segura para compartilhar o espaço aéreo dos grandes aviões comerciais – uma combinação que leva em conta o aprendizado com a trágica colisão de um jato Legacy com um avião de carreira, anos atrás, de modo que as circunstâncias não se repitam.
Para tanto, um dos focos de investimento em inovação foi a segurança de voo, pensando no sistema de tráfego aéreo como um todo e nas soluções (pertinentes às aeronaves) para evitar seu congestionamento, já que a expectativa é vender uma grande quantidade de jatos Phenom. Assim, sistemas de ampliação da consciência situacional (visão sintética), capacidade de varredura vertical de condições meteorológicas, melhor desempenho em ascenção e pouso, além de spoilers automáticos multifunção, controlados por Fly-by-wire, foram introduzidos. Falando neste último item, os novos Legacy 450 e 500 empregam o sistema não só para ampliação da segurança, mas para melhorar as respostas da aeronave às condições de turbulência, acelerando as respostas para amortecer as variações no nível de voo. Segundo Ranieri, a empresa está no momento pesquisando o “Fly-by-Optical”, entre outras tecnologias inovadoras.
Outras inovações mostradas referem-se também ao segmento de defesa, com o KC-390 (veja tela de apresentação acima e clique para ampliar), mas a maior parte do conteúdo apresentado fazia referência à aviação executiva e à regional, assim como aos processos de fabricação: aquisição de 14 novos robôs (nada menos que metade deles para a produção de asas e empenagens dos Legacy 450/500), sistemas de inspeção ultrasônica, sistemas 3D, laser, entre outros. Também foram destacadas as pesquisas na área de bioquerosene (com a Azul Linhas Aéras Brasileiras), estruturas avançadas (metálicas e compostas), de redução de ruído e de emissão de poluentes, softwares de aviônicos. Ao final, e em linha com o tema França-Brasil do evento, Ranieri destacou alguns dos diversos fornecedores franceses da Embraer (veja tela).
Ao final, uma pergunta para pensar no futuro, envolvendo EADS e Embraer:
Os leitores que acompanham o Poder Aéreo sabem que tanto a EADS quanto a Embraer resolveram investir na remotorização de seus atuais produtos mais vendidos (respectivamente família A320 e E-190/195), para redução dos custos operacionais das aeronaves, postergando o lançamento de novos aviões para os mercados desses produtos. Para o público presente ao evento, também atento a esses movimentos, a pergunta que Bruno Gallard lançou a Fernando Ranieri soou quase como um convite: “A inovação custa caro. Como fazer parcerias para dividir custos dos próximos aviões, com desenvolvimentos bem mais caros, estimados em 8 bilhões de euros?” Ranieri respondeu que parcerias são mandatórias, seja para a fase competitiva quanto pré-competitiva (pensando em daqui a 20 anos). Mas, além disso, é fundamental contar com investimentos de capital próprio e de apoio governamental para desafios dessa monta.
Não perca, amanhã, a segunda parte desta matéria, com as apresentações da Thales / Omnisys e da Arianespace