Toda Força Aérea que se preze planeja com grande antecedência o seu futuro. Muitas vezes “olhando” décadas à frente do presente. Com a FAB, não é diferente. Os estudos que precedem o programa F-X, por exemplo, nasceram quando os principais vetores de combate da FAB tinham perto de 15 anos de atividade e previa-se sua substituição dentro de dez anos ou algo próximo disso. Quando a Força Aérea teve que escolher um caça que substituísse os já ultrapassados P-40 e P-47, a escolha recaiu sobre o jato britânico Gloster Meteor porque ele atendia aos critérios técnicos da Força e sua aquisição poderia ser feita através de trocas comerciais. O pagamento dos aviões foi feito com algodão que estava estocado pelo governo federal. Este é considerado o primeiro caso de “offset” da Força Aérea.
A aquisição dos Gloster Meteor representou um passo importante no processo de escolha de um caça, pois pela primeira vez houve negociação do tipo “offset”. A aeronave atendia aos requisitos operacionais da FAB, mas não havia um estudo definido do seu ciclo de vida (FOTO: MUSAL)
Esta escolha teve nítida vantagem comercial para o Brasil, mas as necessidades logísticas e operacionais para todo o seu período de uso (“ciclo completo de uso”) foram relegadas para segundo plano. Posteriormente, já no início da década de 1970, a FAB incorporou um novo vetor de caça (o Mirage IIII) associado à implantação de um moderno sistema de defesa e controle do espaço aéreo brasileiro. O modelo de gestão e escolha do caça foi muito mais evoluído que o processo anterior, mas a FAB não estipulou o momento certo de sua desativação e consequente renovação da frota. Ao mesmo tempo em que a FAB selecionava o seu novo caça, o Ministério da Aeronáutica criava, em março de 1969, o Comando Geral de Pesquisas e Desenvolvimento, logo depois renomeado para Departamento de Pesquisas e Desenvolvimento (DEPED). Naqueles primeiros anos de vida o DEPED não pôde se envolver abertamente no programa de escolha do novo caça. Aquele departamento estava bastante ocupado com a implantação da indústria aeroespacial brasileira moderna, que nascia na forma da Empresa Brasileira de Aeronáutica – Embraer.
A contribuição do programa AMX
Já na década de 1970, o DEPED passou a se envolver em vários outros programas da FAB, inclusive no programa A-X que culminou na formação do consórcio Brasil-Itália para a produção do caça-bombardeiro AMX. O desenvolvimento do jato ítalo-brasileiro representou uma verdadeira escola para a FAB no que diz respeito a projeto, produção e desenvolvimento de um caça moderno. Por causa do programa AMX, a FAB ativou em 1981 a Comissão Coordenadora do Programa Aeronave de Combate (COPAC), órgão subordinado ao DEPED, para gerenciar aquele projeto tão complexo e único na Força.
O programa AMX trouxe muitas novidades para a FAB Uma delas foi o acesso a novas tecnologias e processos. Na foto acima o primeiro brasileiro protótipo do AMX em São José dos Campos em 1987 (FOTO: Poder Aéreo)
A complexidade do programa era tamanha que a FAB foi obrigada a estabelecer novas diretrizes e procedimentos para que o gerenciamento do mesmo fosse feito de maneira adequada e organizada. Por mais burocrático que possa parecer, isto gerou frutos inestimáveis para toda a Força, sendo estendido para outras áreas do Ministério da Aeronáutica. No final, um dos subprodutos do programa AMX foi a geração de documentos e normas técnicas de uso amplo no processo de aquisição de material aeronáutico. Um dos principais documentos que nasceram daquela fase foi a diretriz DMA 400-6, que passou a ser empregada em todos os projetos de grande importância da FAB, como o P-X, o VC-X, o CL-X, o CH-X, o F-5BR e finalmente o F-X.
Como foi feito o processo de escolha
Unindo conceitos de organização, administração e gerenciamento de projetos, o Ministério da Aeronáutica criou a diretriz DMA 400-6 – Ciclo de Vida de Sistemas e Materiais da Aeronáutica, em 1992. A diretriz, de forma simplificada e resumida, é um método de avaliação e escolha de fornecedores. Ela parte do princípio de uma necessidade da Força de adquirir um determinado equipamento (no caso um caça), passando por todo o seu ciclo de vida operacional (incluindo utilização e eventual modernização), estendendo-se até a sua desativação. É interessante saber um pouco sobre a DMA 400-6 porque ela é a base de sustentação de todo o programa F-X. Pela primeira vez na história da FAB, ela buscou uma aeronave da caça que atendesse a todos os requesitos, sejam eles técnicos, operacionais, logísticos, industriais e comerciais. O processo inicia-se com a definição dos requisitos operacionais e, com base neles, a comissão de seleção elabora os requisitos técnicos de uma forma muito mais detalhada, bem como define as exigências de ordem comercial e industrial. Nesta etapa as empresas são consultadas para fornecerem informações (RFI – request for information) sobre os seus equipamentos. Todo este emaranhado de informações é apresentado para as empresas interessadas na forma de um pedido de oferta (RFP – request for proposal) e, com base nestas informações, as empresas apresentam suas ofertas. A etapa seguinte é a análise das propostas, comparando-as com os requisitos previamente estabelecidos. A avaliação é feita de forma individualizada por equipes especializadas nas áreas técnica, logística e comercial. Cada item recebe uma nota e no final são computadas as pontuações gerais. As propostas que obtiverem as pontuações mais altas formarão o “short list”. O número de propostas contidas no “short list” pode variar entre três e quatro.
Fluxograma de decisão adotado para o programa F-X. Clique na imagem acima para ampliar.
Para as empresas selecionadas no “short list”, são solicitadas informações adicionais, realizadas visitas técnicas às instalações industriais e programados voos de ensaios realizados por pilotos brasileiros. Com o resultado destas novas informações as empresas são chamadas uma por uma para fornecerem novos esclarecimentos (“face-to-face”). Depois das reuniões e dos esclarecimentos as empresas reencaminham suas ofertas revisadas que são novamente analisadas. A etapa seguinte é o estabelecimento de uma data, local e hora para que os concorrentes apresentem suas melhores e definitivas ofertas (best and final offer – BAFO). Todo o processo de avaliação é então encaminhado para o Conselho de Defesa Nacional (CDN) que escolherá uma das propostas. Por último ocorre a negociação e a elaboração dos contratos comerciais, financeiros e de “offset” com a empresa da proposta vencedora. Em seguida o contratos são assinados.
Os estudos iniciais
Quando o Ministério da Aeronáutica passou a estudar um substituto para os caças da FAB no início da década de 1990, o Estado-Maior da Aeronáutica (EMAER) ficou responsável pela definição dos Requisitos Operacionais Preliminares (ROP). O ROP tinha como objetivo definir, em caráter preliminar (como o próprio nome sugere), as características de desempenho em termos qualitativos e quantitativos. Como não poderia deixar de ser, o caça deveria possuir grandes velocidades ascensional e horizontal, operar a partir de pistas relativamente curtas e empregar armamento inteligente. O EMAER emitiu o ROP em 1995. Coube ao DEPEP desenvolver as especificações detalhadas do novo avião a partir do ROP do EMAER. Dentro da estrutura do DEPEP existia um órgão denominado Subdepartamento de Desenvolvimento e Programas (SDDP) que, na realidade, também era a própria COPAC. O SDDP, em conjunto com outros órgãos como o CTA, começou a trabalhar nos Requisitos Técnicos, Logísticos e Industriais Preliminares (RTLIP). Este foi concluído em 1996 e encaminhado ao EMAER para aprovação.
O programa F-X e seus requisitos
A FAB reuniu na elaboração do programa F-X toda a experiência obtida pelo país na aquisição, desenvolvimento, produção e operação de aeronaves. Nada foi deixado de lado. A proposta era bastante detalhada, possuía critérios claros e etapas bem definidas. Todo o programa foi planejado para ser implantado em um curto espaço de tempo, haja vista a necessidade de desativar os Mirage III por volta do ano de 2005. A concorrência deveria ser oficializada em 1998 ou, no mais tardar, em 1999, com a emissão do pedido de propostas (RFP – request for proposal). A proposta vencedora seria anunciada em 2001, juntamente com a assinatura do contrato, e os primeiros jatos seriam entregues 48 meses depois. Destra forma, não existiria um hiato (“gap”) entre a entrada em atividade do novo vetor e a aposentadoria dos Mirage III.
Foto de um Mirage IID da FAB poucos meses antes do mesmo dar baixa. O caça escolhido pelo programa F-X deveria substituir os aviões do 1ºGDA primeiramente (FOTO: Poder Aéreo)
Em relação ao número de caças, no início não existia um valor fixo, podendo variar de 12 a 24 unidades. Posteriormente, ele foi fixado em 12, sendo oito monopostos e quatro bipostos. No entanto, era de conhecimento geral que este número cresceria com o tempo conforme surgisse a necessidade de substituir os F-5 e os A-1. O novo caça teria que ter capacidade multifuncional (missões de interceptação, superioridade aérea, ataque ao solo, ataque naval e necessária adequação para realizar missões de reconhecimento e supressão de defesas) em arena visual e BVR (além do alcance visual) e operação diurna e noturna em qualquer condição meteorológica. As aeronaves deveriam ser dotadas de radar multímodo avançado, navegação autônoma, capacidade para emprego de armamento inteligente e eventuais sensores externos. Em relação à motorização, os caças poderiam ser mono ou bireatores, desde que apresentassem pós-combustão. Cada uma das empresas concorrentes deveria garantir que todos os equipamentos e tecnologias empregados pelo caça não apresentassem restrições ou limitações de exportação para o Brasil. Caso isto ocorresse, a empresa vencedora teria que arcar com as mudanças advindas desta decisão, incluindo os custos relacionados à mesma. Por esse motivo, foi exigido dos concorrentes o fornecimento em detalhe das políticas de restrição à exportação de equipamentos e tecnologias (incluindo softwares e hardwares) dos países de origem. Os armamentos que seriam empregados pelo caça já deveriam estar integrados, e os que por ventura viessem a ser integrados não poderiam sofrer restrições de exportação para o Brasil. Neste quesito, o programa deixa muito claro que o código-fonte deveria ter arquitetura aberta para que a FAB pudesse integrar o que ela bem entender ao longo da vida da aeronave. Em relação à transferência de tecnologia, esta faria parte do programa de compensação industrial, comercial ou tecnológica (“offset”). Os setores da compensação previstos para o F-X abrangem o Comando da Aeronáutica, a indústria brasileira, instituições de ensino e pesquisa e indústria nacional. O objetivo principal seria o de obter o máximo de autonomia nacional possível, mantendo boa capacidade operacional e logística para a manutenção das aeronaves. Isto também facilitaria uma eventual modernização de meia-vida dos aviões. A FAB estabeleceu como limite mínimo um “offset” equivalente a 100% do custo do programa. As empresas concorrentes poderiam adquirir bens e serviços relacionados com o “offset” antes mesmo da declaração do vencedor final. Sendo assim, a assinatura de memorandos e acordos preliminares com empresas nacionais antes da definição estavam liberados.
Obsolescência em bloco
Na metade da década de 1990 o fantasma da “baixa em bloco” começou a rondar a FAB. Aviões como o P-16E Tracker, o C-115 Buffalo, o Mirage III e o Xavante (e o F-5 algum tempo depois disso) seriam retirados de serviço dentro de dez anos, aproximadamente. Portanto, somente a renovação da aviação de caça não resolveria os problemas da FAB. Era necessário algo maior.
Já no final do ano de 1995 e começo de 1996 começaram a surgir na imprensa brasileira informações sobre como seria esta renovação dos meios da FAB. Naquela época o EMAER trabalhava com uma visão ampla para evitar obsolescência em bloco de toda a Força.
O cancelamento do programa P-16H decretou a aposentadoria dos Trakers com certa antecedência. Um substituto para eles era mais do que necessário. Na foto acima um P-16E preservado na Base Aérea de Santa Cruz (FOTO: Poder Aéreo)
O EMAER era comandado pelo então tenente-brigadeiro Sérgio Xavier Ferolla. Ferolla tinha a experiência certa para falar sobre caças. Além de ter sido piloto de caça (1ºGAvCa), havia sido Chefe do Grupo Assessor da Comissão de Programa Aeronave de Combate (COPAC) e, posteriormente, vice-diretor do próprio DEPED. Como se não bastasse tudo isso, o brigadeiro Ferolla ainda reuniu uma boa experiência na parte de desenvolvimento e transferência de tecnologia no programa de desenvolvimento do caça-bombardeiro AMX. Foi membro residente da comissão diretora do programa na Itália e posteriormente chefe da delegação brasileira. Sua experiência ainda foi coroada com diversas passagens pelo CTA, exercendo várias funções nas áreas de pesquisa e desenvolvimento. Foi durante o seu comando no EMAER que o Ministério da Aeronáutica lançou em 1996 o “Plano Fênix”, um amplo programa que visava modernizar e FAB, substituir os vetores mais obsoletos e aumentar a operacionalidade da força. Programas como P-X (nova aeronave de patrulha, esclarecimento marítimo e ASW), CL-X (aeronave de transporte médio), ALX (aeronave de ataque leve e treinamento avançado) e o próprio F-X passaram a ser tratados dentro de um único conjunto. Ao todo eram previstos investimentos da ordem de 3,35 bilhões de dólares (valores de 1996) por meio de financiamento externo parcelado em sete anos. Em relação à aviação de caça, o plano previa a modernização dos F-5E/F Tiger II, a aquisição de aeronaves ALX (posteriormente denominada A/T-29) para substituir os Xavantes, complementação da força de AMX com o recebimento de mais 14 jatos (totalizando 56 unidades) e aquisição de um novo vetor de caça conforme os requisitos do programa F-X. Para este último o Plano Fênix previa um financiamento de até 700 milhões de dólares. Portanto, o F-X passou a ser tratado dentro do Plano Fênix e não isoladamente.
Quem entra na disputa
Na mesma época em que o DEPED trabalhava no RTLIP, o Ministério da Aeronáutica encaminhava os pedidos de informação (RFI – request for information) para um grupo de sete empresas que produziam aeronaves de caça. Receberam o RFI as norte-americanas Lockheed Martin e Boeing/McDonnell Douglas, as européias Saab, Dassault e o consórcio Eurofighter, além da russa VPK-MAPO (fabricante da família MiG). A FAB sempre preferiu caças de origem norte-americana por diversos fatores, incluindo aqueles de ordem técnica, logística e tecnológica. Mas a FAB também sempre se ressentiu de não poder adquirir aqueles equipamentos que mais desejava por imposições do governo norte-americano. Mas a situação geopolítica mundial era completamente diferente na segunda metade da década de 1990. Até mesmo alguns setores dentro e fora do governo norte-americano começaram a manifestar forte reação contrária à proibição da venda de material militar mais avançado para os países da América Latina. As restrições não impediram que os países adquirissem caças avançados de outros fornecedores. A França, por exemplo, vendeu em menos de 20 anos cerca de 200 aviões de caça para a América Latina em negociações que ultrapassaram quatro bilhões de dólares. Estava claro que Washington, além de não estar atingindo seus objetivos estratégicos, ainda perdia uma ótima oportunidade para as suas indústrias aeroespaciais. A mudança veio em agosto de 1997. A administração Clinton levantou as restrições impostas há mais de 20 anos, quando o presidente Carter “congelou” qualquer venda de material militar sensível. Com isso, houve tempo para que as empresas Lockheed Martin e Boeing/McDonnell Douglas pudessem fornecer seus produtos às concorrências que se iniciavam no Brasil e no Chile. A Lockheed Martin oferecia seus caças F-16C/D e a Boeing/McDonnell Douglas o F/A-18C/D Hornet. Além dos dois concorrentes norte-americanos, era praticamente certa a participação da Dassault. Naquela época a empresa francesa produzia duas aeronaves principais de combate, o Mirage 2000 e o Rafale. O primeiro tinha grande aceitação no mercado e em 1997 Taiwan começou a receber os primeiros dos 60 caças encomendados, assim como o Qatar. Já o Rafale era uma aeronave ainda em ensaios e com um custo de aquisição mais elevado. Também da Europa o consórcio Eurofighter 2000 seria outro candidato. Assim como o Rafale, o Eurofighter ainda estava em desenvolvimento. A Alemanha, um dos países participantes do programa, somente obteve aprovação do seu governo em 1997 para adquirir a aeronave. A presença do Gripen entre os candidatos não era exatamente uma surpresa, mesmo porque a FAB já havia estudado a possibilidade de adquirir caças de origem sueca no final da década de 1960. Era um projeto bastante moderno, de baixo custo de aquisição e manutenção, quando comparado com outros caças da mesma categoria. Os primeiros exemplares do modelo JAS 39A haviam entrado em atividade na Força Aérea da Suécia em 1996. A novidade, fruto da mudança geopolítica mundial já mencionada, ficou por conta da participação dos russos. A VPK-MAPO oferecia sua versão mais moderna do famoso caça MiG-29 . Após o conflito no Cenepa, a Foca Aérea do Peru recebeu um lote de caças MiG-29 – o que, de certa forma, mexeu com o balanço militar da região. Inicialmente, a empresa russa OKB Sukhoi não participava do programa F-X. Sua admissão só foi feita no último trimestre de 1997. A proposta previa uma versão multifuncional do caça Su-27, tecnologicamente semelhante às versões encomendadas pela Índia e China continental.
O Su-35 foi o último candidato a entrar no programa F-X. Na foto acima uma montagem com a aproximação do mesmo na pista de Belém (FOTO: Rosoboronexport)
Com a definição dos participantes começou um processo de marketing e divulgação das aeronaves e seus fabricantes nunca antes visto no país. Caças F-16 e Mirage 2000 frequentaram os céus do país em diferentes oportunidades, fruto dos exercícios aéreos denominados “Operação Tigre” e “Operação Mistral”. Também estiveram de passagem pelo Brasil, por ocasião da 10ª FIDAE (Feira Internacional del Aire y Espacio) ocorrida no Chile em 1998, dois Saab Gripen e dois Sukhoi (Su-35 monoplace e Su-30K biplace). A versão mais atual do Mirage 2000, o “-5 Mk2” foi apresentada à FAB em abril de 2000, quando o mesmo foi demonstrado em Canoas e em Anápolis.
Outras Prioridades
Das metas estabelecidas pelo Plano Fênix as que estavam em fase mais adiantada eram aquelas relacionadas ao projeto SIVAM (Sistema de Vigilância da Amazônia). O contrato de desenvolvimento do ALX havia sido assinado no ano anterior (1995) e o programa de ensaios do EMB-145 AEW&C/BEM-145RS caminhava bem.
A implantação do programa SIVAM era uma das poucas coisas que antavam bem na segunda metade da década de 1990 para a FAB. Acima um R-99 adquirido através do program SIVAM (FOTO: Poder Aéreo)
Mas em 1996 a FAB cancelou o projeto P-16H, que previa modernização dos aviões em uso pelo 1º Grupo de Aviação Embarcada. Os aviões acabaram sendo desativados ao final daquele ano. Assim, a FAB ficou sem uma aeronave ASW, além de ter a sua capacidade de esclarecimento marítimo diminuída. O programa P-X passou a ser prioridade. Mais ou menos nesta época os “insubstituíveis” C-115 Buffalo começaram a dar sinais de cansaço. Encontrar peças e componentes para esta aeronave, cuja linha de fabricação havia sido encerrada em 1972 (!), tornou-se um grande problema para a Força. Por diversas vezes houve a necessidade de se enviar uma outra aeronave porque o Buffalo não conseguiu terminar a missão. O programa CL-X também não podia mais esperar. Em relação à aviação de caça, a Ministério da Aeronáutica fez o que pôde com os seus recursos para manter o compromisso de adquirir, pelo menos, 56 caças AMX (A-1 e A-1B), sendo que o último foi recebido em 1999. O programa de modernização dos caças F-5, por envolver uma quantia não tão expressiva como os outros programas, acabou sendo formalizado em 1998 com a escolha da empresa Elbit para compor juntamente com a Embraer a espinha dorsal do programa F-5BR. A FAB atravessava uma época de poucos recursos e o F-X caminhava numa velocidade menor do que o esperado. Esta lentidão teria reflexos futuros e indesejados.
Não era só a economia mundial que estava em crise em 1999. As aeronaves da FAB apresentavam baixa disponibilidade. Além disso, aviões como os F-5E necessitavam de verbas para sua modernização. Porém, os Mirage seriam aposentados em breve (FOTO: FAB)
Um período de crise
Fundada em 1969 a Embraer surgiu de uma iniciativa do Ministério da Aeronáutica de criar uma indústria aeroespacial forte no país. A Embraer praticamente nasceu dentro do CTA (Centro Técnico Aeroespacial) e a maior parte do seu quadro pessoal veio do próprio Ministério da Aeronáutica. A Embraer havia sido privatizada em 1994, mas o governo, através da Aeronáutica, continuou mantendo fortes vínculos com a empresa. O programa Fênix, lançado posteriormente à privatização, considerava fundamental a participação da Embraer para a renovação e modernização da frota. Era previsto também que a empresa aeronáutica tivesse uma grande participação após a escolha de uma aeronave para o programa F-X. Notícias veiculadas na imprensa nacional dão conta de que o empresário sueco Peter Wallemberg se reuniu com o então presidente da Embaer, Maurício Botelho em dezembro de 1996. O objetivo era negociar a venda de 20% do capital acionário da empresa brasileira para, num futuro não muito distante, produzir parte do Gripen no Brasil. O Alto Comando da Aeronáutica tinha conhecimento das negociações, via com bons olhos, mas não se intrometeu no caso. O negócio não chegou a ser fechado. A surpresa veio em 1999. No dia 25 de outubro daquele ano Embraer anunciou a venda de 20% de suas ações ordinárias para quatro companhias aeroespaciais francesas (Aérospatiale-Matra, Dassault, Snecma e Thomson-CSF). A negociação foi feita, segundo informado pelo próprio Ministério da Aeronáutica, sem o conhecimento e o consentimento do governo, que detinha assento permanente (“golden share”) no conselho de administração da empresa. O controle acionário permaneceu nas mãos do grupo Bozano, Simonsen e dos fundos de pensão Previ e Sistel. Na época Botelho afirmou que a aliança estratégica com os franceses não estava condicionada à execução de nenhum projeto específico no curto prazo. O consórcio francês tinha assento no conselho de administração da Embraer, mas não podia impor nenhum projeto ou mudança nos rumos da empresa. Formalmente nada havia sido noticiado, mas estava claro que o grupo francês tinha interesse na venda de caças para a América Latina, incluindo o programa F-X da FAB e a concorrência chilena “Caza 2000”. De qualquer forma a negociação das ações criou um mal-estar entre a empresa e o governo. O ministro da Defesa Élcio Álvares contestou a venda, afirmando que a mesma prejudicaria o país em aspectos militares -portanto, de defesa nacional- e comerciais, ficando a FAB subordinada à linha de equipamentos franceses. As reações dentro do Ministério da Aeronáutica foram mais fortes. O caso mexeu com os brios dos militares, que lutaram arduamente pelo desenvolvimento de uma indústria aeroespacial independente. Em dezembro o comandante da Aeronáutica, brigadeiro Walter Bräuer, foi demitido do cargo pelo ministro da defesa. Oficialmente ele teria ofendido a hierarquia durante um lamentável episódio político. Mas o caso da Embraer também teve uma grande parcela de culpa. No dia da despedida do brigadeiro Bräuer, o Alto Comando da FAB divulgou uma nota de apoio ao ex-comandante. Assumia o cargo o tenente-brigadeiro-do-ar Carlos de Almeida Baptista e ano de 1999 terminava com uma crise instalada na Aeronáutica. O caso foi avaliado pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, pelo Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) e pela AGU (Advocacia Geral da União). Nenhuma irregularidade foi encontrada e o caso terminou com a aprovação da negociação pelo Cade. Até mesmo as regras do programa F-X permitiam antecipadamente a aquisição de bens e serviços relacionados com o offset (ver texto acima). De qualquer forma o estrago havia sido feito e a Aeronáutica ficou com o caso atravessado na garganta. A crise na Aeronáutica no final de 1999 nada mais era do que um descontentamento dos militares com a situação das Forças Armadas. Ano após ano os recursos necessários para manter a frota voando vinham diminuindo. Em 1996 perto de 30% da frota da FAB estava parada. Este índice subiu para quase 60% no início de 2000. Das 775 aeronaves do inventário da FAB, 449 não tinham condições de vôo. Além da diminuição da disponibilidade das aeronaves, o número de horas voadas também caiu, chegando abaixo dos 180 mil horas de vôo anual, considerado um patamar mínimo para o porte da FAB. Algo precisava ser feito.
O F-X toma fôlego
No dia 13 de julho de 2000, o governo brasileiro anunciou o Programa de Fortalecimento do Controle do Espaço Aéreo Brasileiro (PFCEAB). O programa, na verdade uma reinvenção do Plano Fênix, previa investimentos da ordem de 3,5 bilhões de dólares em dez anos. Com isso o próprio programa F-X ganhou fôlego. Ainda havia tempo para se evitar o “gap” se todo o processo fosse conduzido em aproximadamente um ano e meio. Assim, o EMAER determinou a continuidade do estudo de viabilidade do projeto. O início do processo de seleção, com dispensa de licitação, foi aprovado pelo Comando da Aeronáutica. Também foram aprovados os requisitos, o critério de seleção e a metodologia de avaliação do F-X. Estava tudo pronto para o lançamento do RFP. O dia 1º de agosto de 2001 foi marcado pelo lançamento do RFP. Havia se passado um ano desde que o governo aprovara o PFCEAB. Com base no RFP todas as empresas que responderam ao RFI podiam elaborar as suas respectivas propostas. Acontece que cinco semanas depois, surgiu uma revisão do RFP, que revogou uma parte da documentação anterior. A FAB recebeu de volta cinco propostas formais no dia 15 de outubro. No dia 16 a EADS, representando o consórcio Eurofighter, e a Boieng (fabricante dos caças F/A-18) desistiram formalmente da concorrência. Em ambos os casos elas declararam que o produto que tinham a oferecer não se encaixava nos requisitos do RFP, principalmente em relação ao orçamento anunciado.
A Boeing e a EADS desistiram do programa, pois o os seus produtos não se encaixavam nos requisitos da FAB. Em relação ao F/A-18C (foto acima) este teria a sua linha de montagem encerrada em breve, substituída pela fabricação do “Super Hornet” (FOTO: USN)
Com a desistência das duas empresas formaram-se cinco consórcios. O primeiro deles, denominado Mirage BR, era composto pelas empresas européias Dassault/Thales/EADS/Snecma e pela Embraer. Este grupo oferecia ao Brasil a versão mais moderna do Mirage 2000, o “-5 Mk2”. A Gripen Internacional, formada pela sueca Saab e pela britânica BAe, oferecia o caça Gripen JAS 39C/D. A Lockheed Martin, única representante norte-americana na disputa, propôs o F-16C/D Block 50/52 muito semelhante ao modelo que havia vencido a concorrência chilena em dezembro de 2000. Por último os russos tinham dois consórcios distintos, sendo o primeiro formado pela MAPO, com o seu MiG-29M, e o segundo formado pela Rosoboronexport, representante da Knaapo, com o caça Sukhoi Su-35. Interessante notar que a concorrência passou a ser dominada por caças monorreatores. Os únicos birreatores eram os concorrentes russos. Pelo prazo original a FAB deveria encerrar a primeira fase do programa F-X em dezembro de 2001 com a definição de uma “short list”. No entanto, a mesma comunicou que o resultado havia sido adiado para março do ano seguinte. Isto já era um sinal de que algo não estava indo bem. Neste momento os consórcios em disputa se mexiam nos bastidores. Durante a visita do presidente Fernando Henrique Cardoso à Rússia no final de 2001, o presidente da Avibrás Aeroespacial, João Verdi Carvalho Leite, assinou um convênio com a estatal russa de venda de armas Rosoboronexport. Para não ficar atrás o consórcio BAe/Saab, que já mantinha ligações com a Varig, também aproveitou a onda e associou-se à VEM (Varig Engenharia e Manutenção). Março chegou e nada aconteceu. Nenhuma “short list” foi produzida e todos os competidores continuavam no páreo. O programa começava a se desviar de suas metas iniciais. No mês seguinte equipes da FAB começaram a visitar as instalações dos concorrentes e os aviões foram voados por pilotos brasileiros. Foi também em abril que a agência DSCA do Pentágono notificou o congresso dos EUA sobre uma provável venda de caças F-16 ao Brasil. No pacote, avaliado em 909 milhões de dólares, estavam 48 mísseis AMRAAM AIM-120C, liberados pelo Departamento de Defesa para países da América Latina. Todas as informações coletadas geraram novos documentos e com base nestas informações representantes dos consórcios foram chamados para novos esclarecimentos. Toda esta etapa foi encerrada no dia 20 de maio de 2002, quando os cinco consórcios apresentaram suas melhores e definitivas ofertas (best and final offer – BAFO). Deste ponto em diante, coube ao Ministério da Defesa analisar e encaminhar o documento ao Conselho de Defesa Nacional (CDN), que deveria apontar o vencedor. Existia uma certa pressa da Aeronáutica em definir o F-X, pois havia o risco do processo ser “contaminado” pelas eleições presidenciais que se aproximavam. Dependendo dos resultados eleitorais, os rumos do projeto F-X poderiam ser modificados. Não teve jeito, o programa F-X passou a ser explorado pelos candidatos. Deve-se destacar que os três principais concorrentes à presidência defenderam abertamente a proposta que incluía a Embraer sem ao menos ter acesso ao documento produzido pela FAB. Para complicar mais o quadro o Tribunal de Contas da União (TCU) passou a investigar supostos favorecimentos no processo.
O progrma C-X, assim como o P-X, não foram contaminados pela campanha eleitoral e puderam ser aprovados sem maiores problemas (FOTO: Poder Aéreo)
Em agosto o governo já sinalizava que uma decisão final ficaria para a próxima administração, independentemente do candidato vitorioso. A FAB sabia que, naquela altura do campeonato, qualquer decisão poderia não ter validade para o governo seguinte. Pelo menos os programas P-X e CL-X, que não tinham tanta exposição política, foram salvos. Na reunião do CDN ocorrida no dia 4 de novembro ficou decido que a EADS/CASA modernizaria os P-3A da FAB, além de fornecer 12 aviões C-295. O F-X não seria decidido naquele momento. Era a FAB entregando os anéis para não perder os dedos. Quando saiu o resultado final das eleições o presidente Fernando Henrique Cardoso anunciou que a escolha do futuro caça da FAB seria feita pelo novo governo com base nos documentos produzidos pelo Ministério da Aeronáutica. Segundo especulações da época o relatório era extremamente favorável ao Gripen. O programa F-X vivia momentos de apreensão e expectativa.
O “gap” inevitável
A possibilidade de um hiato entre a entrada em operação do novo caça e a saída do Mirage III já era analisada pelo Comando da Aeronáutica desde 2001. Na melhor das hipóteses o caça que seria escolhido no F-X somente entraria em operação no final de 2007 e os Mirage deixariam de voar no dia 31 de dezembro de 2005. Estava formado o “gap”. Não era só a FAB que tinha noção desta lacuna. Várias empresas enxergaram no “gap” uma nova oportunidade para fornecer um caça que cobrisse o hiato. Muitos apelidaram o mesmo de “caça-tampão”e parte da imprensa começou a denominar o caso de “o apagão do sistema de defesa aéreo”. De qualquer forma a proposta de se equipar o 1º Grupo de Defesa Aérea (GDA) com uma aeronave usada ganhou corpo. Poderia ser por compra direta ou leasing.
O COMAER chegou a divulgar o leasing de um esquadrão de caças IAI Kfir (FOTO: Wiki/Bukvoed)
Uma das propostas que mais tinha força dentro do Ministério da Aeronáutica era o leasing de um esquadrão de caças IAI Kfir (dependendo da fonte pesquisada poderiam ser C2, C7 ou C10) pertencentes à Força Aérea de Israel e estocados no deserto. O Comando da Aeronáutica chegou a divulgar uma nota no dia 31 de julho confirmando o arrendamento dos caças israelenses IAI Kfir por 91,6 milhões de dólares (pagos em cinco anos) por um período de uso de dois anos. Os aviões deveriam chegar no ano seguinte. Esta proposta em especial gerou muita polêmica, pois foi imposta sem maiores análises das ofertas do mercado e o representante da IAI no Brasil tinha grandes ligações com o Comandante da Aeronáutica. Na mesma época em que a proposta do leasing do Kfir veio a público, o Comando da Aeronáutica recebeu do embaixador da África do Sul no Brasil uma carta na qual a indústria de defesa sul-africana registrava o interesse de oferecer seus caças Atlas Cheetah (versão modernizada localmente do Mirage III) que estavam próximos de sua aposentadoria na Força Aérea da África do Sul. A oferta falava em leasing, mas não ganhou força na Aeronáutica. No início de 2003 a proposta evoluiu para venda direta e o negócio era estimado em 70 milhões de dólares.
O governo a África do Sul ofereceu formalmente seus caças Denel Cheetah, que seriam substituídos pelos Gripen (FOTO: SAAF)
Pelo lado dos norte-americanos foram oferecidos caças F-16A/B usados, provenientes da Força Aérea da Holanda que seriam desativados em breve. A Saab sinalizou com a possibilidade de transferir 12 caças Gripen diretamente da Força Aérea da Suécia. A Dassault propôs um programa de manutenção dos Mirage III da FAB, capacitando-os a voarem muito além de 2005. Os russos não quiseram ficar atrás e também fizeram sua proposta em dezembro de 2002. Por 15,8 milhões de dólares a unidade entregariam um esquadrão de 12 caças Su-27SK usados. Estes caças poderiam ser entregues imediatamente e sua recompra era certa no final do uso. Existia também uma outra proposta de venda de MiG-29 provenientes diretamente dos estoques da Força Aérea Russa. A escolha de um caça usado para preencher o hiato acabou por tumultuar ainda mais o processo de escolha do futuro caça brasileiro. Por um certo momento, a necessidade de sanar o “gap” retirou os holofotes sobre a questão principal.
O F-X é suspenso
Quando a nova administração assumiu o governo federal em janeiro de 2003 o programa F-X era somente mais uma das diversas preocupações então existentes. No entanto, durante a campanha eleitoral o então candidato Luiz Inácio Lula da Silva havia se declarado favorável a uma solução brasileira para a compra dos caças. Em outras palavras, suas declarações favoreciam a Embraer e sua consorciada Dassault. Superpreendentemente uma das primeiras decisões tomadas pelo novo governo dizia respeito ao programa F-X. Pouco menos de 48 horas depois do presidente tomar posse o porta-voz do Palácio do Planalto, André Singer, fez a seguinte declaração: “o presidente disse que ainda não há uma definição, mas a visão dele sobre esse assunto é que talvez o gasto de US$ 1 bilhão para a compra de jatos não seja adequado ao momento que o Brasil está vivendo e talvez esse gasto seja melhor utilizado no combate à fome”. A decisão de suspender o processo foi confirmada pelo ministro da Defesa José Viegas Filho um dia depois de assumir o cargo. No entanto, o mesmo sinalizou que a retomada do programa ocorreria em até um ano. O novo comandante da Aeronáutica, Tenente-Brigadeiro-do-Ar Luiz Carlos da Silva Bueno, acabara de assumir o seu posto e, pego de surpresa, também nada pôde fazer. A verdade é que o processo não poderia esperar muito, pois as propostas tinham prazo de validade de dois anos contados a partir da entrega do BAFO em 20 de maio de 2002. Ciente disso, a Aeronáutica solicitou aos concorrentes uma atualização da BAFO. Representantes dos consórcios foram convocados para uma reunião no Comando da Aeronáutica no início de outubro e atualizaram suas respectivas as propostas. O passo seguinte era novamente apresentar os relatórios atualizados da FAB ao CND, para que este assessorasse o presidente na decisão final. Previa-se o anúncio do vencedor para o final de 2003 ou começo de 2004. Ocorre que na véspera do Natal de 2003 foi publicado um decreto criando uma comissão especial para assessorar o Conselho de Defesa Nacional na aquisição dos novos caças. A decisão ficou para o ano seguinte. Definitivamente 2003 foi um ano para a FAB esquecer. Além da suspensão do F-X, ainda houve a explosão do terceiro protótipo do VLS-1 em agosto e o programa de modernização dos F-5 apresentava problemas de integração.
A Embraer perdeu?
Era esperada uma decisão para meados de março. Na verdade o relatório final da comissão foi apresentado ao Palácio do Planalto no dia 25 de março. Faltava somente uma definição do presidente. Notícias veiculadas pela imprensa da época davam conta de que a vencedor deveria ficar entre o Su-35 e o Gripen. Um dos aspectos mais importantes eram as contrapartidas comerciais destas duas propostas, muito superiores às contrapartidas oferecidas pelo consórcio Mirage 2000BR. Deixando as especulações de lado, o fato é que a Embraer emitiu uma nota no dia 31 de março afirmando que considerava uma distorção “atribuir maior valor e importância a compensações de caráter comercial em detrimento daquelas de caráter tecnológico”. Uma das possíveis interpretações da nota demonstra que a empresa, se não havia perdido a licitação da FAB, pelo menos estava em situação desconfortável perante os demais concorrentes. Independentemente do que realmente ocorreu (quem sabe no futuro os verdadeiros fatos surjam), o fato é que em qualquer concorrência aqueles que perdem procuram tumultuar o processo. Cresceu assim o grupo daqueles que queriam o cancelamento da disputa. Já em abril de 2004 era praticamente certo que o F-X será cancelado. Em compensação o programa VC-X, que procurava uma aeronave que substituísse os KC-137 que serviam à presidência, ia de vento em popa, devendo o Airbus 319 (adquirido por 56,7 milhões de dólares) chegar em dezembro daquele ano. Em função de uma série de eventos políticos o Ministro da Defesa José Viegas ficou desprestigiado dentre os demais integrantes do primeiro escalão. Os rumos do F-X desagradavam o governo. Começou um processo de “fritura” do ministro, embora o governo negasse quaisquer mudanças ministeriais. A FAB desconfiou que qualquer decisão sobre o F-X dependia de uma mudança no Ministério. O programa como um todo permaneceu em compasso de espera. No final do ano a “profecia” se concretizou. Viegas entrou em rota de colisão com o Exército após a instituição ter publicado uma nota na qual justificava as ações repressivas da ditadura militar. Era o fim. Viegas pediu demissão e o vice-presidente José Alencar assumiu a pasta. Com Alencar no ministério, o Sukhoi ganhou novo fôlego na disputa. O vice-presidente havia visitado a Rússia dias antes, onde deu uma entrevista defendendo a compra do Su-35. No entanto, para o Ministério da Defesa o final de 2004 foi marcado pela grave crise da Varig e o assunto F-X foi perdendo espaço na mídia e no governo. No dia 22 de fevereiro de 2005 o brigadeiro Aprígio Eduardo de Moura Azevedo, chefe do DEPED, aquele mesmo órgão que uma década antes esboçou os primeiros traços do futuro caça brasileiro, enviou uma carta bastante sucinta a cada um dos cinco consórcios do F-X. Em poucas palavras e sem maiores justificativas, ela informava que a seleção está encerrada. Faltavam 312 dias para os Mirage III do 1º GDA se aposentarem.