O programa F-X2 e a autonomia tecnológica industrial
Eduardo Siqueira Brick*
O Brasil está por fazer um investimento de grande porte em 36 aeronaves de combate para a FAB. Trata-se de uma aquisição que comprometerá, por um longo tempo, sua capacidade aeroespacial, tanto operacional, quanto produtiva.
Apesar de ser assunto de grande relevância, o mesmo não tem sido adequadamente debatido, principalmente no que diz respeito à identificação dos objetivos prioritários, aos critérios de decisão mais adequados a esses objetivos e à análise das várias soluções de compromisso possíveis.
Em primeiro lugar cabe a seguinte questão: Qual é o maior benefício que o Brasil deveria esperar desse investimento?
O principal benefício está na contribuição que ele pode dar ao credenciamento do Brasil como um país com forte capacidade industrial, baseada em Ciência, Tecnologia e Inovação.
Não há alternativa para a soberania, a independência e o desenvolvimento econômico e social, que não seja essa, pelos seguintes motivos:
a) garante competitividade no mercado internacional para produtos com maior valor agregado (O Brasil, perigosamente, vem se transformando em um país exportador de commodities com baixo valor agregado);
b) proporciona empregos de melhor qualidade e renda; e
c) é componente importantíssimo do Poder Efetivo do país, principalmente do militar, sem o qual o Brasil não conseguirá dissuadir ameaças nem defender com eficácia, e com custos reduzidos, seus interesses nos fóruns internacionais, onde decisões que o afetam são tomadas.
Portanto, a motivação principal não é somente a defesa do país, em curtos e médios prazos, mas sim a sua capacitação tecnológica industrial para enfrentar um futuro incerto, tanto do ponto de vista de competitividade no mercado internacional quanto de defesa.
Um investimento desse porte não será feito talvez nos próximos trinta anos. Não se pode perder esta oportunidade. A falta de ameaças presentes é um argumento a mais a favor.
Assumindo que o objetivo síntese acima delineado – a obtenção de autonomia tecnológica industrial – represente o principal benefício desse investimento, cabe agora analisar os critérios de escolha, que podem ser classificados em cinco categorias.
Importância Estratégica: Sob este critério, a melhor proposta é aquela que mais contribua para credenciar o Brasil como um país capaz de desenvolver Ciência, Tecnologia e Inovação em alto nível e para o fortalecimento de uma indústria competitiva a nível internacional, tanto para uso civil como militar.
É sabido que a maneira mais eficaz de absorver tecnologia é participar ativamente do desenvolvimento, na mesma medida em que não há transferência de tecnologia para quem não sabe desenvolver. Licenças de fabricação ou “off-sets” não relacionados à concepção, projeto e desenvolvimento do sistema principal não contribuem muito para este fim.
Política: A Estratégia Nacional de Defesa prevê, entre outras coisas, a opção pela capacitação da Base Industrial de Defesa (BID) brasileira e sinaliza com a possibilidade de se estabelecerem alianças estratégicas com outros países.
Entretanto, é necessário ter alguns cuidados, pois não se pode confiar cegamente na durabilidade das parcerias entre estados, porque as situações mudam. Por esta razão, a parceria estratégica com qualquer dos candidatos (França, Suécia e EUA) deve ser analisada sob o ponto de vista do objetivo principal de avançar com a maior celeridade possível na direção de uma grande autonomia tecnológica para defesa.
Ao fazer uma opção também é bom observar o problema de assimetria entre parceiros. Em tese, quanto mais vulnerável e/ou equivalente for o parceiro, maior a possibilidade de uma parceria que envolva desenvolvimentos conjuntos, fornecimento de componentes críticos e acesso ao mercado internacional. No fundo é isso que realmente importa.
Eficácia operacional: Este é o nível puramente militar do problema. Evidentemente é o MD quem deve definir se as alternativas atendem às necessidades de defesa do Brasil. Cabem apenas duas considerações:
a) Já houve uma pré-seleção das alternativas. Evidentemente, apenas aquelas que atendiam às necessidades do Brasil passaram no crivo inicial;
b) O Brasil dispõe de um tempo razoável para “perder” no desenvolvimento de uma solução com grande dose de participação da indústria brasileira. Este tempo nos é ofertado pela falta de ameaças relevantes nos curtos e médios prazos.
Eficiência/Custo: Aqui é importante chamar a atenção para o fato de que o custo que interessa não é apenas o de aquisição das aeronaves. O que vale é o custo de posse por toda a vida útil. Este envolve os custos de concepção, desenvolvimento, fabricação, operação, manutenção, modernização e desativação.
O custo de aquisição, para sistemas desse tipo, é muito inferior aos demais. A imagem que se usa para ilustrar este fato é a do iceberg. A parte visível do iceberg é o custo de aquisição. A parte imersa, muitíssimo maior, representa os demais custos.
Ignorar essa realidade é receita segura para um cenário de indisponibilidade de recursos para custear a operação e de meios parados por falta de manutenção ou sucateados.
Logística: Um aspecto que se deve ressaltar é o fato que uma aeronave militar moderna depende de muitos componentes críticos que, hoje, sofrem grande cerceamento por parte dos países que detém essas tecnologias.
A Embraer alcançou grande competitividade internacional, mas sua cadeia de suprimentos está localizada majoritariamente no exterior, principalmente para esses itens críticos.
A dependência de componentes críticos representa uma grande vulnerabilidade. O Brasil não pode ter a ilusão de que obterá os itens críticos de que necessitar no mercado internacional em todas as situações, principalmente aquelas de crises internacionais.
De qualquer forma, qualquer que seja a escolha entre as três alternativas disponíveis, este investimento não vai resolver todos os problemas. Sua solução requer medidas novas e mais abrangentes. Este também é um longo processo que não pode mais ser postergado sob pena de comprometimento irremediável do futuro da nação.
*Professor do Departamento de Engenharia de Produção e coordenador-adjunto do Núcleo de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense (UFF).
FONTE: Monitor Mercantil
Excelente texto.
Muito bom o texto… é realmente esta a linha de raciocínio que deveria ser seguida sobre o FX-2.
Pancho, esta foi a linha seguida pela FAB, daí o Grippen em 1º, F-18 em 2º e, na lanterninha quem ? quem ? quem ? Rafale !!!!!
É o que eu diria. Essa foi a linha seguida pela FAB.
Só quem não a está seguindo é alguém que acha que sabe muito mais muito mais que qualquer um !!! É o nosso reizinho MULLAH LuLLa LLá e o Omar Vado Lobobin.
Só um detalhe : estivessemos nós na Venezuela e eu poderia me preparar para ser prêso, tal como aquele dono do único canal de TV , ainda, independente .
Disse pouco, mas disse tudo.
Espero que os defensores daquele caça de origem francesa que possui custos ALTÍSSIMOS, agora mudem de ideia.
[]s
Mas e a questão dos componentes americanos e europeus? E o motor?
Eu não compreeendo direito essa questão da absorção de tecnologia… se o Grippen fosse o escolhido, teoricamente, nós aprenderíamos a fazer o q de fato? Aprenderíamos a “fazer um Grippen” ou ganharíamos impulso para desenvolver algo novo no futuro?
E com o Rafale, seríamos capacitados a construir / desenvolver o q?
JZG_Pedro disse: 16 de junho de 2010 às 17:07 É “Gripen” mesmo amigo, com um só “p”. E ninguém vai nos ensinar a construir 100% de um caça, a menos que comprássemos a empresa inteira (e ainda assim os governos dos países desenvolvedores teriam uma ou duas palavrinhas a dar sobre o tema…) E as tecnologias adquiridas tem propósitos duplos, tanto militares quanto civis, e no final das contas “se pagam”. Agora, alguém com um banco de dados (eu guardo tudo de cabeça) lhe explique o que uma e outra proposta transferirá de tecno, menos a francesa, claro, cuja ToT… Read more »