Cyclone-4 deverá ser lançado na próxima administração
Projeto só deve decolar depois do governo Lula
Marcelo Ninio/Rafael Garcia
A aspiração do presidente Lula de assistir ao primeiro lançamento de um foguete ucraniano Cyclone-4 de Alcântara (MA) ainda durante o seu governo tem poucas chances de se concretizar, devido aos sérios problemas de financiamento enfrentados em Kiev.
O acordo Brasil-Ucrânia para lançar foguetes a partir do CLA (Centro de Lançamento de Alcântara) foi um dos carros-chefes da visita a Kiev que o presidente concluiu ontem. O prazo de dezembro de 2010 foi citado várias vezes por Lula e pelas autoridades ucranianas.
Mas uma alta autoridade do governo que integrou a comitiva brasileira indicou que as dificuldades de capitalização do lado ucraniano tornam o cumprimento do prazo praticamente impossível. O projeto do foguete a ser usado na empreitada ainda não foi concluído. “Deve ficar mesmo para o próximo governo”, admitiu, pedindo para não ser identificado.
Segundo ele, a contraparte ucraniana da empresa binacional ACS (Alcântara-Cyclone Space), criada para tocar a empreitada, começou a articular há cerca de quatro meses uma solução alternativa. Seria o pedido de um empréstimo de US$ 200 milhões ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) para possibilitar a continuação do projeto dentro do cronograma previsto: lançar o Cyclone-4 ainda no mandato de Lula.
Mas o banco já emitiu um primeiro parecer negativo sobre o pedido, acrescentou a mesma fonte, alegando que o empréstimo a empresas estrangeiras contraria as normas da instituição. (Quem precisa do financiamento não é exatamente a ACS, que tem metade de seu capital brasileiro, mas o consórcio ucraniano que vai desenvolver o foguete.)
Apesar disso, o presidente Lula afirmou ontem, em reunião com a premiê ucraniana, Yulia Tymoshenko, que instruiu o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Miguel Jorge, a buscar formas de possibilitar o empréstimo necessário.
Conexão Kiev
A ACS não quis comentar a informação. A Folha apurou que a manobra a ser articulada era um empréstimo do BNDES à empresa binacional, o que é legal. Esta, então, faria um repasse às empresas ucranianas do consórcio que faz o foguete, a Yuzhnoye e a Yuzhmash.
A contraparte brasileira da ACS, porém, estaria se mostrando contra essa solução alternativa, que poderia vir a ser condenada pelo TCU (Tribunal de Contas da União).
O BNDES, também, teria receio de abrir um precedente de violação de suas regras justamente para alavancar empresas estrangeiras de um país que está financeiramente mal, em razão do risco de calote.
O risco de a ACS deixar de operar, porém, não existe, pois a empresa já está capitalizada, tendo recebido US$ 485 milhões de ambos os governos. Mas o projeto deve atrasar se os construtores do foguete não conseguirem o empréstimo.
O projeto da ACS já havia sofrido atrasos desde o momento que os governos de Brasil e Ucrânia firmaram acordos. A empresa já teve de mudar o local designado para a plataforma de lançamento do foguete, que originalmente ocuparia um território reivindicado por comunidades quilombolas de Alcântara. A área da empresa agora ficará toda dentro do CLA, que é controlado pela Aeronáutica e abrigará também o foguete VLS, projeto brasileiro de um veículo lançador de satélites com menor porte.
O projeto da ACS ainda depende de licenças do Ibama. Segundo a binacional, os documentos devem sair em breve. Em 18 de dezembro, a empresa discutirá o projeto com as comunidades locais em uma audiência pública em Alcântara.
FONTE: Folha de São Paulo
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