Voando no simulador do Gripen: da diversão do voo à tensão do pouso

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Os rasantes foram divertidos. A aproximação foi perfeita. E o pouso foi…

Na primeira parte deste relato sobre o voo no simulador do Gripen, que no último dia 23 de novembro roubou a cena no “Open Innovation Seminar” realizado no Grand Hyatt Hotel de São Paulo, deixei os leitores a 30.000 pés e Mach 0.9. Mas já havia avisado que a sequência envolvia alguns rasantes sobre uma cidade sueca.

Como entre a altitude em que me diverti com algumas firulas e o aeroporto de onde decolei havia uma boa distância vertical e horizontal, o instrutor Stefan Svensson me passou o rumo para uma última correção de rota, já atento ao próximo ocupante do assento. Entre uma rápida curva à direita para o rumo 05 (estava em trinta e tantos), preferi um preguiçoso círculo quase completo à esquerda, e acredito que Stefan compreendeu que era meu jeito de me despedir, o mais lentamente possível, do nível das nuvens.

Por não ter voado outros caças em simuladores dessa categoria, não posso comparar a experiência do simulador do Gripen C com o de outras aeronaves, se é mais ágil, potente etc. Além do que estou muitíssimo longe de ser um “piloto” com cacife para tanto. Mas posso dizer que a impressão de manobrabilidade, agilidade, aceleração e disponibilidade de potência que o pequeno caça sueco passou, no simulador, foi das melhores. É óbvio que a configuração quase limpa, com pilones vazios sob as asas e fuselagem e dois mísseis ar-ar nas pontas das asas, também teve seu papel. Essa configuração podia ser vista num monitor fora do simulador, onde outras pessoas podiam acompanhar uma representação do caça fazendo as mesmas manobras – e foi uma dessas imagens que escolhi para abrir esta matéria.

Voltando às impressões desse voo no simulador do Gripen: relembrando minha “experiência de ex-piloto virtual” com muitas horas em versões simuladas de Messerschmitt Bf-109 da Segunda Guerra Mundial, faço minha a opinião do ás alemão Adolf Galland (figura bem lembrada por um dos leitores do Poder Aéreo), quando este voou o jato Me-262 pela primeira vez, em 1943. É como se um anjo estivesse empurrando a aeronave. No caso do meu “voo” no Gripen, esse anjo estava um tanto endiabrado, e incentivava a curtir a região das nuvens. Mas era hora de descer, e o diabo também tentava a dar alguns rasantes sobre a cidade bem lá pra frente, que Stefan apontou pra mim, ali na telona mesmo.

Já que estava num simulador de caça supersônico, nada mais natural do que apontar o nariz lá pra baixo num mergulho direto, sem me preocupar em reduzir a potência que mantinha o caça na velocidade de cruzeiro de aproximadamente 0.9 Mach. Em instantes passei de Mach 1, pouco me importando com as vidraças dos prédios virtuais que eu iria arrebentar quando nivelasse sobre a cidade. Conversa vai, conversa vem e rapidamente chega a hora de sair do mergulho.

Sem ter tanta noção quanto à rapidez do caça em atender ao comando, preocupado em não dar o vexame extremo de “arar o solo” (mesmo com poucas testemunhas) e ao mesmo tempo querendo simular uma carga G aceitável na saída acima de Mach 1, acabo nivelando a 600 pés, e não aos 300 pés que o instrutor tinha sugerido. Baixo para 280 pés e Stefan aciona, num dos botões da tela de navegação, o comando para que eu mantivesse aquela altitude e rumo sem tocar na manete ou no manche.

De mãos livres, aproveito para tirar uma foto de Stefan mexendo na tela de navegação, e peço que ele tire uma foto minha sem as mãos nos comandos, para não esquecer daquele voo e daquela fase em especial. E tiro mais algumas visando o painel e o HUD (visor ao nível dos olhos) – não muito boas, é verdade, mas o que eu menos queria fazer era ficar tirando foto.

 

Depois de assustar boa parte dos habitantes virtuais de Liköping voando tão baixo e a uns 1.000 km/h (sim, eu lembrei o nome óbvio da cidade, onde não por acaso fica a Saab – foi a pronúncia em sueco que me confundiu), chegou a hora de pousar. Não sem antes Stefan me mostrar, ao lado do aeroporto, onde fica seu escritório. Balancei as asas sobre o prédio, para cumprimentar seus colegas que “estavam” lá. Uma breve subida para uns 2.000 pés e fiz uma grande volta para entrar no circuito de pouso.

Enquanto isso, Stefan acertou o padrão desse circuito acionando uns dois botões da tela de navegação e no controle frontal (logo abaixo do HUD), para compensar minha falta de familiaridade com os comandos no manche e na manete. Ainda assim pude utilizar alguns desses botões do conceito HOTAS para isso, seguindo suas instruções. E toda a simbologia para a aproximação e aterrissagem apareceu no HUD. Bastava manobrar para colocar a “seta”ou “pipper” num pequeno círculo que dava o curso correto e que depois passou a apontar diretamente para a pista, cuja posição já estava indicada por dois traços verticais no HUD.

A leve descida havia sido iniciada com a manete em iddle, mas a partir dos 600 pés e com o trem de pouso baixado (desta vez baixei na hora e na velocidade certa), já foi preciso controlar a potência na manete para manter a velocidade em aproximadamente 150 nós na final. Com um pouco de tensão natural para não fazer besteira no pouso, a pista logo ali e o pequeno círculo indicando o ponto ideal para o toque, foi a vez da “experiência” de pousos com o velho Bf-109 virtual ajudar a controlar a velocidade certa com a manete, já que o ângulo de descida do caça ia se alterando conforme eu variava suavemente a altitude para manter o pipper no círculo.

Pela primeira vez, Stefan elogiou alguma habilidade de “pilotagem” minha, destacando a boa coordenação do manche com a manete, e o toque se deu tranquilamente (o pouso extra-curto, que é feito com ângulos que chegam a 40 graus, fica obviamente para uma outra vez). Hora de reduzir a potência novamente para iddle e ficar satisfeito com o pouso praticamente perfeito. Como assim, perfeito? Melhor contar o fim da história direito:  na hora de frear com os pedais (que achei bem leves), acabei colocando mais força num deles e o caça saiu um pouco para a esquerda. Exagerei na correção e saí lentamente do curso, um pouco antes da saída para a pista de táxi, à direita. Mas não haveria ninguém reclamando de um pouco de grama sujando os pneus, muito menos o Stefan, que dando risada confirmou que o pouso tinha sido muito bom… até aquele momento! Nos despedimos e anotei seu sobrenome, Svensson, com cuidado para não errar depois – ainda que ele tenha se surpreendido com a atenção, já que na Suécia é o equivalente ao “Smith” dos EUA (ou ao “Silva” do Brasil).

Mais tarde, levei uma leve “bronca” na conversa com o editor-chefe do Poder Aéreo por não ter pedido para gerar alguns alvos, soltar uns mísseis simulados etc. Mas cada coisa a seu tempo. Sei que isso seria do agrado de muitos que acompanham este site mas não traria nada de novo, já que não domino esses sistemas e simbologia: quem iria “derrubar” os alvos, no fim das contas, seria a dupla instrutor / automação do Gripen.

Assim, acredito que o voo em si foi mais do que  suficiente para esse “piloto virtual” de Bf-109, que gostava mesmo é de disparar metralhadoras e canhão, ter uma experiência e tanto com esse simulador do Gripen e transmitir um pouco disso aos leitores:  comandos Fly-by-Wire, excesso de potência, agilidade, manobrabilidade e muito mais recursos de automatização do que minha memória podia reter. Em resumo, exatamente o que se espera de um simulador de caça da quarta geração. Até a próxima oportunidade!

VEJA A PRIMEIRA PARTE:

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