A formação de caçadores: o próximo passo
Visão de um piloto vivido – Gilberto Schittini
Todos os aviões de treinamento da FAB já passaram dos 25 anos de idade. Ainda que seja possível que essas “airframes” tenham ainda alguns anos a mais de vida, a qualidade do treinamento obtido com eles já é discutível, mesmo se considerarmos apenas a necessidade de treinamento para as aeronaves de primeira linha atualmente em serviço. Para as novas aeronaves, que deverão entrar em serviço nos próximos 10 anos, não há a menor dúvida de que o treinamento ministrado atualmente será insuficiente e inadequado.
Nenhuma manifestação foi feita pela FAB, indicando que uma procura para compra de novos treinadores ou modernização dos atuais será perseguida em curto prazo, entretanto não há dúvida de que o assunto começará a ser tratado brevemente.
Não se antecipa que os futuros treinadores devam ser capazes de proporcionar qualquer novo treinamento relacionado à pilotagem, pois isto não é requerido pelas atuais aeronaves ou será requisito pelas futuras aeronaves operacionais, entretanto elas possuem inúmeras características que já demandam vários tipos de treinamento específicos para os quais os treinadores atuais não são adequados.
Tanto o manuseio dos novos instrumentos, quanto a interpretação dos novos símbolos de apresentação dos dados nesses instrumentos deve ser aprendido, de preferência, já no primeiro treinador.
À medida que o piloto em formação avança no programa de treinamento passando pelos estágios básico, avançado e operacional, novos treinamentos como: novos procedimentos de navegação e aproximação de uso pela aviação civil, navegação operacional a baixa altura, uso do enlace de dados, emprego de equipamentos de visão noturna, reabastecimento em vôo e manobras com alto G devem ser feitos. Não será aceitável esperar para que estes treinamentos sejam obtidos na aeronave operacional que, provavelmente, não terá uma versão com dois lugares devido ao custo no caso das aeronaves de caça e ao custo operacional das aeronaves de transporte o que tornará impraticável longos programas de treinamento em vôo dessas aeronaves.
É certo que, no futuro, o avião será mais um dos vários meios de treinamento, o mais importante de fato, junto com os outros como: dispositivos para treinamentos de procedimentos, dispositivos avançados de treinamento baseados em computador e diversos tipos de simuladores, que apesar de não terem a mesma importância do avião serão de valor inestimável. É de se esperar que o treinamento virtual seja quase tão importante quanto o real exigindo uma visão sistêmica de todo o processo que envolve a formação dos pilotos.
O objetivo final do processo de treinamento da Força Aérea é a seleção e a formação de pilotos operacionais nas várias aviações que compõem a Força. A necessidade da seleção é um ponto importante a ser sempre lembrado, pois a pilotagem militar, seja dos aviões de caça ou de transporte, sempre será uma atividade para uma elite de pilotos. O piloto militar tem que ser capaz de pensar e agir sob a pressão típica das ações militares além de desenvolver sua capacidade de liderança.
A estrutura do sistema de treinamento do futuro poderá ser muito similar à estrutura atual, entretanto veremos uma utilização cada vez maior dos dispositivos de treinamento simulado.
O sistema de treinamento será um sistema de sistemas: um sistema de treinamento inicial ou primário adequado para a primeira seleção (initial screening), muito importante para evitar gastos com pessoal que poderá ser cortado mais tarde; um sistema de treinamento básico/avançado onde o candidato a ser piloto militar adquire e desenvolve conhecimento e habilidades típicas da pilotagem militar e, por último, um sistema de treinamento operacional.
Para maximizar a eficiência dos sistemas de treinamento eles necessitarão estar perfeitamente integrados e alinhados de modo que na fronteira de cada sistema o treinando tenha adquirido todo conhecimento e habilidade que o prepare para terminar a fase seguinte. Além disso, todo o treinamento típico da fase posterior que possa ser executado com os meios da fase anterior deverá ter sido feito. Por exemplo: se o treinamento de vôo por instrumentos pode ser feito usando os meios de treinamento da fase primária é nesta fase que ele deverá ser executado.
É necessário que cada sessão e cada manobra tenham o seu propósito bem definido; sejam bem detalhadas; o nível de aprendizado/desempenho do aluno, o método de avaliação e os critérios para aprovação sejam bem estabelecidos. Considerando que tal sistema de sistemas de treinamento deverá contemplar as necessidades da aviação de caça, das outras aviações que usam aviões de transporte ou similares e a aviação de asas rotativas é de se esperar que a Força Aérea tenha uma enorme tarefa a executar nos próximos anos.
Um avião de treinamento, a ser adquirido, que deverá causar uma competição tão acirrada quanto o FX-2 será no futuro treinador operacional. Com a aposentadoria do AT-26 a FAB deverá voltar sua atenção para a obtenção de um substituto num prazo bem curto. Certamente ela não irá optar pela seleção dos pilotos de caça e pelo treinamento de combate nas suas aeronaves de primeira linha, isto seria pouco eficiente e custoso.
As primeiras competições para este avião já estão sendo vistas. Temos o British Aerospace Hawk 128 sendo usado pela RAF, o Locheed/Korean Aerospace Industries T-50 em uso pela Força Aérea Sul Coreana e o Alenia Airmacchi M-346 que parece ser o candidato para um programa de treinamento avançado europeu. A escolha técnica de um destes aviões não será muito fácil, pois suas capacidade são semelhantes e possivelmente deverá, mais uma vez, ser uma escolha de um parceiro tecnológico e comercial.
FONTE: Administradores.com, via Notimp
NOTA DO BLOG: veja nos links abaixo algumas das diversas matérias já publicadas pelo Poder Aéreo sobre o assunto:
- Enquanto isso, o LIFT da FAB é…
- Um LIFT de projeto brasileiro
- Após caças, Brasil deve investir U$ 1 bi em jatos de treinamento
- Força Aérea Suíça: do turboélice PC-21 ao jato F/A-18 Hornet, sem intermediários
- M-346 Master vence KAI T-50 nos Emirados Árabes Unidos
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- Alphajets franceses e F-5M (B) espanhóis, lado a lado
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- Mais Hawks modernizados para a Força Aérea Finlandesa
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- T-50 Golden Eagle e M-346 Master no Singapure AirShow 2010
- Mako HEAT, um mock-up bem cool
- Que tal um LIFT ‘genérico’?
BATE-PAPO ONLINE: Converse com outros leitores sobre este e outros assuntos no ‘Xat’ do Poder Aéreo, clicando aqui.
Treinador será necessário sim e essa questão já deveria estar sendo vista faz tempos agora precisamos saber se essa concorrência vai demorar 16 anos para ser concluída.
Mas na minha opinião o T50 Golden Eagle e YAK130 seriam ótimas opções para FAB.
Abs.
Amigos,
A visão do Schettini sobre as necessidades de instrução está completa e bem estruturada.
Só tem um problema no final.
Todo o treinamento avançado está sendo feito hoje, muito bem e conforme as necessidades que ele listou, no A-29.
Esse avião tem um custo de operação muito inferior (e custo de aquisição ZERO, pois já estão todos comprados) aos eventuais substitutos do Xavante que ele propõe.
A missão tem que ser cumprida. Um avião desativado não quer dizer obrigatoriamente que ele tenha que ser “substituído”, se outro já cumpre bem a missão.
Abraços,
Justin
Justin, vale lembrar que o tipo de treinamento e seleção possível no A-29 é justamente o ponto principal das críticas do autor, conforme já li em outros textos dele publicados a cada dois meses na Revista Força Aérea. Isso na minha interpretação, obviamente. Ele normalmente argumenta que o treinamento para caçadores, que ele coloca como a elite dos pilotos, precisa de um outro vetor, no qual se faça uma seleção rigorosa como na época em que ele era caçador na FAB. Ele me parece ser da ala que questiona mais o papel do A-29. Hoje, o autor acha que o… Read more »
Nunão, boa tarde. Logicamente a situação não é simples e as duas opções de formação estão sendo exercitadas no mundo. Minha intenção, e acho que consegui, foi levar a uma reflexão mais profunda sobre a necessidade de um “lead in fighter” ou treinador avançado a jato. Acho que essa questão é prioritária em relação a qual seria o modelo selecionado. Outro problema seria fazer a seleção em um avião mais avançado que o A-29. Os que não fossem escolhidos para F-X iriam fazer o quê? Voltar para o A-29 como caçadores de 2ª linha? Tentariam depois fazer o curso novamente,… Read more »
Justin, boa noite. Concordo que a questão da necessidade do Lift é mais importante sobre qual o modelo, e creio que vc foi bem sucedido em levar a uma reflexão mais profunda a respeito (já desde outros comentários a respeito). Sobre suas perguntas, elas são minhas também! Mas seleção tem essas coisas, e ela já existe desde antes da questão de quem vai para a primeira linha da caça – na Academia da Força Aérea, já se seleciona quem vai seguir para a caça, para transporte / patrulha ou asas rotativas, com os “melhores” (no sentido de mais próximos do… Read more »
Esta questão, treinamento de pilotos militares é algo que não existe uma formula apenas. Diria que se colocassemos 20 especialistas diferentes para apresentar uma solução cada um teriamos 20 soluções diferentes, cada qual com vantagens e desvantagens. A primeira coisa que temos que analisar quando tratamos de FAB é que as aeronaves de treinamento obedecem um padrão ditado mais por questões industriais do que necessariamente operacionais. Explico melhor. Em um país que esta desenvolvendo sua industria aeronáutica, normalmente um dos primeiros projetos é um treinador militar, isto é em função de serem aeronaves relativamente simples e com demanda governamental garantida,… Read more »
Eu gosto da opção Hawk e mais ainda da opção GosHawk. Seriam ótimos.
Mas existem outros tb. Porém, gosto muito de pensar no T-45.
Há os que defenem que o treinamento com caças precisa de um estágio onde o treinador tenha de ser um jato também. Fica a polêmica pois em artigo anterior mostra que a Suiça “tira” seus pilotos do Pilatus e manda para o F18 sem outro jato de treinamento antes. Ainda acho que bobearam com o Xavante… Se a Embraer ainda detém a licensa de fabricação, poderiam no decorrer dos anos implementar modernizações que o fariam um avião melhor e dentro do que há de moderno em equipamentos. Creio que para os Xavante nem mesmo deter sua licensa, talvez, fosse necessário.… Read more »
Acho muito importante a opinião do Cel Schittini, mas seria interessante saber porque ele considera que o A-29 não pode fazer o papel de “selecionador” que o AT-26 fazia. Como ele não aborda este tema no artigo, imagino que o tenha feito em um artigo anterior. Também acho que existe uma questão de prioridades. Os recursos da FAB são finitos, e dinheiro gasto em um LIFT é dinheiro que vai ser retirado de alguma outra coisa. Dentro do contexto das necessidades da FAB, como por exemplo o desenvolvimento de VANTs e a formação de pilotos para os mesmos, a substituição… Read more »
Grifo, Também acho a opinião do Cel Schittini bastante válida e com pontos muito importantes. Mas talvez eu não tenha sido claro no que eu interpreto como crítica dele ao A-29. Na minha opinião, é menos em relação ao avião e mais em relação ao seu papel. Transcrevo trechos de outra opinião dele, no artigo “Regressar às Origens”, da RFA n.64 – jun/jul do ano passado, em que aborda o Estágio de Seleção de Pilotos de Caça (ESPC) introduzido em 1946, e a própria experiência dele: “Depois de muito tempo mantendo o mesmo padrão de resultados no estágio de seleção,… Read more »
Caro Nunão, obrigado por colocar melhor o contexto. Pelo que entendi, o Cel Schittini associa a introdução do A-29 a um relaxamento no processo de seleção e formação dos pilotos de caça da FAB. No entanto não vi ele mencionar (talvez o faça em outro ponto) onde estaria a relação de causa e efeito. O A-29 como equipamento impede o uso de um padrão mais exigente de seleção? Se sim, por quê? O cuidado aqui é não cairmos na conhecida falácia “cum hoc ergo propter hoc”, onde se assume que se dois efeitos aconteceram ao mesmo tempo, existe uma relação… Read more »
Nunão, se me permite para enriquecer o debate, gostaria de copiar aqui uma opinião de um outro ex-instrutor de caça, copiado do Fórum Base Militar. O assunto “formação do piloto de caça e a sua transição para as aeronaves de primeira linha” vem sendo debatido internamente na FAB há muito tempo. Existem muitas correntes de opinião, todas com forte embasamento teórico e prático. Nesse assunto, cada país é prisioneiro das suas circunstâncias. As nossas, são a de uma força aérea com poucos recursos, dotada de poucas aeronaves de primeira linha, possuindo uma grande frota de Super-Tucanos e de F-5s. Existem… Read more »
Grifo, Com certeza o debate está enriquecido. Acho que um “Fast Track”, logo após o final do curso no 2º/5º GAV, como você escreveu (e como eu também acho que escrevi, meio perdido no meio de um dos comentários acima) seria algo a se pensar, para seleção dos melhores entre os melhores. Sobre a relação causa e efeito, talvez tenha alguma pista em outro texto, talvez não. Ainda creio que o ponto dele é mais em relação à sistemática que ao meio. Porém, acredito que ele defenda uma seleção feita em aeronave mais próxima em desempenho dos jatos de primeira… Read more »
“…utilizar o conceito de OCU (Operational Conversion Unit), tal como faz a Inglaterra, Austrália e a US Navy, onde a…”
São tdos operadores de alguma versão do Hawk, então existe mais um estágio, antes da conversão operacional.
Nunão,
Se vc gosta de uma “reunião etílico-acadêmica”, precisa conhecer o Grêmio Lítero Recreativo Cultural Misto Carnavalesco Eu Acho É Pouco.
Agremiação carnavalesca, sai pelas ruas de Olinda no sábado de Zé Pereira e desfila no Recife Antigo no domingo de carnaval.
Abç,
Ivan, do Recife e Olinda.
“Ivan em 16/01/2011 às 1:20” “Grêmio Lítero Recreativo Cultural Misto Carnavalesco Eu Acho É Pouco” é um dos melhores nomes de agremiação carnavalesca que eu já li! Um dia vou ver como é o Carnaval aí em Olinda. Saudações! Sobre a OCU, do outro comentário, concordo plenamente com sua necessidade, desde que o caça equipe esquadrões suficientes. Acho que essa OCU poderia ser, antes da entrada em serviço do vencedor do F-X2, o 2º/1º GAVCA em Santa Cruz, concentrando os F-5M bipostos e utilizando os monopostos do 1º/1º GAVCA (devidamente reforçado em dotação) em pool para as necessidades de um… Read more »
Apesar de conhecer muito pouco acerca de treinamento e formação de caçadores, sempre acreditei que um LIFT – Lead-in Fighter Trainer seria necessário para a FAB, como meio de dar aos pilotos uma experência mais consistente do que é um jato de combate. Confesso que sempre influenciado pela coluna de Gilberto Schittini na Revista Força Aérea, que leio regularmente. Mas o tema merece reflexão. Na mesma coluna referenciada, o ex-caçador tem escrito muito sobre novos recursos, como simuladores de vôo, que precisam ser mais intensamente usados. Talvez com estes novos recursos e a sofisticada aviônica do Super Tucano seja possível… Read more »
“…que transiciona os seus alunos diretamente do T-6A “Texan II” (semelhante ao ST) para o T-38C “Talon” (semelhante ao F-5F). E com bastante sucesso.”
Essa transição é realmente direta ou há o concurso de algumas horas em simulador aí no meio???
Seria o T-6 mais capaz em peneirar os cadetes que o ST, conforme questiona o autor???
“Talvez com estes novos recursos e a sofisticada aviônica do Super Tucano seja possível dispensar um jato intermediário.”
A “sofisticada aviônica” do ST, não está ajudando a fazer o papel básico do treinamento:
Paneirar o plantel disponível.