Muito antes do Eurofighter – parte 2
A história da cooperação europeia no desenvolvimento de projetos de caças, de 1965 a 1985
Desavenças Iniciais
O programa SEPECAT Jaguar evoluía bem e o primeiro protótipo voou em setembro de 1968, apenas três anos após a formação do consórcio binacional. Por outro lado, o desenvolvimento do AFVG foi interrompido com a retirada da França do programa em 1967. Uma das razões principais seria a incompatibilidade dos requerimentos oficiais de cada país.
A França procurava por um interceptador com capacidade secundária de ataque ao solo. Já o Reino Unido necessitava de uma aeronave de ataque com penetração a baixa altitude. Em uma reunião entre representantes dos dois países, ocorrida no mês de maio de 1967, foi dito que as especificações não representavam um obstáculo, mas os custos sim. Em apenas um mês a estimativa de custo do programa passou de 200 milhões de libras esterlinas para 250 milhões. A decisão francesa veio em julho daquele ano. Os franceses retiraram-se do programa.
Maquete do AFVG exibida em Warton. Um dos poucos resultados práticos da parceria franco-britânica no desenvolvimento de caças com asas de geometria variável. O Mirage G (ver foto abaixo) possuía muitas semelhanças com o AFVG (FOTO: BAe)
Havia ainda um terceiro elemento a ser considerado, embora oficialmente negado. A companhia francesa Dassault desenvolvia, com recursos próprios, um avião com asas de geometria variável, denominado Mirage G. Este não era um protótipo, mas sim um demonstrador de tecnologia sem qualquer intenção de entrar em produção. Ele também não cobria por completo os requerimentos da Força Aérea Francesa. Porém, alguns viram o Mirage G como um concorrente do AFVG, e para estes não fazia sentido a França investir em dois projetos similares, sendo que um deles era inteiramente desenvolvido “em casa”.
De qualquer forma, poucos meses depois da saída da França do programa AFVG, o demonstrador Mirage G realizou o seu primeiro voo (18 de novembro de 1967). O término da cooperação foi muito ruim para o Reino Unido, que ficou com poucas alternativas. A mais óbvia delas seria o desenvolvimento sem parceria, que resultaria em um número menor de unidades e o indesejado efeito do aumento do custo unitário.
Outra opção envolvia a produção de um caça menos sofisticado (fugindo dos requisitos iniciais), mas que teria melhor aceitação no mercado externo. Também existia a possibilidade da compra de um caça no exterior, desagradando a indústria local, ou a formação de uma parceria com outros países europeus. Esta última tratava-se de uma verdadeira incógnita, mas bem aceita politicamente.
O Mirage G era um programa da Dassault que visava testar o comportamento de uma aeronave com asas de geometria variável. Apenas um demonstrador foi construído (FOTO: Dassault)
No Reino Unido, os estudos sobre asas com geometria variável prosseguiram, agora com o nome UKVG. Ainda em 1967 a BAC procurou a empresa EWR-Sud na Alemanha, que também desenvolvia os seus estudos com asas de geometria variável no AVS (ver texto anterior). A BAC ofereceu colaboração com o UKVG e a adoção de imediato do Jaguar pela Luftwaffe. As conversas entre britânicos e alemães não geraram resultados práticos imediatos, mas abriram portas para importes realizações que viriam no futuro.
A Alemanha Ocidental insistia na adoção de uma aeronave com capacidade V/STOL tendo como base a doutrina da “Retaliação Maciça” do início da década de 1960. No final da década, a “Retaliação Maciça” foi substituída pela “Resposta Flexível” e isto teve muita influência nos projetos de caças, incluindo a maior carga de armamentos e o ataque com maior precisão.
O AVS era um programa caro, complexo e estava fora de sintonia com a nova doutrina, sendo encerrado no segundo semestre de 1967.
Ainda antes do encerramento da parceria industrial entre alemães e americanos, o governo da Alemanha Ocidental anunciou o programa NKF (Neue Kampffugzeug), com o propósito de encontrar uma aeronave que substituísse o Fiat G.91 e o F-104G da Luftwaffe (o Jaguar havia sido recusado). A EWR propôs uma versão simplificada do AVS (ver imagem ao lado), excluindo a capacidade V/STOL, mas mantendo o as asas de geometria variável. Parceria com outros países também seria aceditável. Os alvos principais eram os parceiros do consórcio F-104G da OTAN ou seja, Itália, Holanda, Bélgica, Noruega, Dinamarca e Canadá.
De olho no que os vizinhos estavam fazendo, o governo britânico decidiu entrar para o consórcio F-104G da OTAN em 1968, mesmo não tendo um único Starfighter em sua frota! Na verdade, a saída da França do programa AFVG e o cancelamento da compra do F-111K deixaram a RAF com poucas opções.
A união do NKF alemão com o UKVG britânico gerou um programa multinacional. Assim surgiu o Advanced Combat Aircraft (ACA). Porém, a Alemanha insistia na manutenção da MBB (Messerschmitt-Bölkow-Blohm, empresa formada em 1968 a partir da união da Messerschmitt com a Bölkow e a parte aeronáutica da Blohm und Voss) como empresa gerenciadora.
No dia 17 julho de 1968, representantes dos países membros do consórcio F-104G da OTAN reuniram-se na capital da Alemanha Ocidental (Bonn) para discutir o futuro do ACA. Assinaram o memorando de entendimento os representantes da Itália, Alemanha, Reino Unido e Holanda. Bélgica e Canadá permaneceram como observadores e Noruega e Dinamarca não demonstraram interesse.
Continua na parte 3
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A saída da França do projeto do AFVG me pareceu a coisa certa para eles. Foi com essa história de requerimentos conflitantes que surgiu o F-111. A USN queria um interceptador, a USAF um bombardeiro. Se a França tivesse seguido adiante, ela teria ficado com um modelo ruim para combate aéreo, como acabou acontecendo com o Tornado ADV que a GB acabou desenvolvendo a partir do Tornado IDS. No final das contas, a França lançou o Mirage F.1 e foi feliz assim, obtendo o melhor caça europeu da década de 70. Ela teria sido ainda mais feliz se os caças… Read more »
Clésio, Vc tem razão, a Alemanha e Inglaterra precisavam do Tornado, que era muito mais um avião de ataque/bombardeiro do que um caça. Inclusive se observar a versão de defesa aérea, o Tornado ADV, vai perceber que é uma aeronave adequada para PAC (patrulha aérea de combate) no Mar do Norte, entrada do Báltico e Canal da Mancha. Mais indicado para enfrentar Backfires, Badgers e Bears, do que para um dogfighter com os MiGs. A França precisava de um caça mais leve. Melhor, ela precisava de um CAÇA. A melhor solução era o Mirage F-1, sem dúvida, que inclusive terminou… Read more »
Caros Clésio e Ivan, Bons comentários. Gostaria de dizer que o Tornado ADV e até mesmo o Mirage F-1 foram resultados de um verdadeiro “eclipse” no desenvolvimento da industria de aviação de caça dos anos 70. Nem sempre sucesso comercial significa que o caça seja bom, no caso do F-1, na época era o que se tinha. Já os ADV, é mais um exemplo de “temos que ter alguma coisa para chamar de caça”.Aquilo para mim, não é um caça, é um lançador de misseis. Fato curioso e quase que inacreditável: Um Tornado não consegue acompanhar um Bear a 41.000… Read more »
Roberto,
Eu sempre soube que os Tornado, tanto IDS como ADV, eram submotorizados, mas isso que vc está afirmando é realmente inacreditável.
Pelo que nós estamos acostumados a ler sua velocidade máxima, com pós-combustores full, está em torno de mach 2,2.
Estou surpreso.
Vc tem alguma fonte do assunto?
De qualquer forma motor é sempre bom.
Abç,
Ivan.
Ivan, A fonte, foi em algum lugar dos 35 volumes (cada volume tem 6 revistas), da revista Air International.O dia que eu achar de novo te falo. O fato é que li isso e também fiquei surpreso como você. Pensando bem, eu duvido que um Tornado com 4 SkyFlash e 4 Sidewinder iria alcançar tal velocidade. E nem, é claro um Bear ser super-sônico. Alcança-lo é uma coisa, acompanhá-lo é outra. Esse projeto russo com certeza, é uma das maravilhas da aviação e penso que no caso em questão os russos deviam esperar pelos britanicos chegarem perto e empregarem um… Read more »
Eu acho que essa questão do ADV contra o Bear merece uma reflexão. O Roberto disse que ele não conseguia “acompanhar” o Bear. Chegar é uma coisa, acompanhar é outra. A velocidade máxima do Tornado, tanto o IDS quanto o ADV é de mais de Mach 2 à grande altitude, esses 41.000 pés (12.500m) que o Roberto citou. O problema é que o Tornado precisa de pós-combustão para chegar na velocidade máxima e isso sem nenhuma carga nas asas (os quatro Skyflash semi-embutidos na fuselagem tem arrasto desprezível). Operando com carga completa de interceptação, ou seja, 2 tanques de combustível,… Read more »
Caro Clésio,
Merece outras reflexões,
Penso que a Rússia é a única que possui patrulha de longo alcance em altitude.Pense numa força de ataque de trinta e seis ou mais desses aviões, já era União Européia.
Imagine também uma jamanta dessas cruzando nossos céus, se dá trabalho para um Tornado, um F-5 nem se fala.
O Brasil merecia o caça ideal para seu tamanho: Sukhoi Su-35.
Tenha fé Roberto. Su-35 é caça de pobre. Depois do Gripen vamos pegar o Pak-Fa 🙂
Bom humor! Mas nada melhor que a realidade, a verdade e o hoje. O fato é que hoje os caças mais temidos são os Sukhoi e o F-22. A alusão aos pobres só preocupa mais. No caso da Venezuela, com certeza é o avião errado.A Colombia vai ter que procurar coisa melhor que o Kfir. O Gripen é muito bom para um Gran Ducado qualquer europeu. Advinhe o avião que os americanos sempre quiseram ter no seu esquadrão secreto de agressores, ou melhor, já tem com certeza. Gripen, Eurofighter Typhoon,Rafale, etc são aviões feitos para manterem o status quo de… Read more »
Roberto F Santana,
É melhor considerar os chineses na sua equação, pois a quantidade tem um valor intrínseco nele mesmo.
Abç,
Ivan.
Pois é Ivan,
Curtis LeMay já deu a fórmula para essa equação de quantidade.
Deus nos livre!